terça-feira, 30 de setembro de 2025

📜 O Encontro de Diógenes e Alexandre


Por Yuri Schein 

[Cena: Corinto. Diógenes está deitado ao sol, ao lado de seu barril. Alexandre, cercado de soldados e aduladores, aproxima-se.]

Alexandre: Eu sou Alexandre, o Grande. Peça-me o que quiseres.

Diógenes (sem se mover): Sai da frente do meu sol.

[Risos nervosos entre os soldados. Alexandre fica surpreso.]

Alexandre: Todos os homens me temem.

Diógenes: Pois eu sou homem, e não te temo.

Alexandre: Admirável ousadia… Se eu não fosse Alexandre, desejaria ser Diógenes.

Diógenes (sorrindo): E se eu não fosse Diógenes, desejaria ser Diógenes.

Alexandre: Não desejas riquezas, palácios, honras? Eu posso dar-te tudo.

Diógenes: Desejo apenas que não desejes tu o que eu possuo.

Alexandre (insistindo): Mas eu sou senhor do mundo!

Diógenes: E eu sou senhor do que preciso. Quem de nós é mais rico?

Alexandre: Então não queres minha proteção? Não desejas ser parte da minha corte?

Diógenes: Estar sob tua proteção é ser teu escravo. Prefiro ser cão livre a leão acorrentado.

Alexandre (mostrando a coroa): E isso? Não te impressiona?

Diógenes: Impressiona… a estupidez de quem a usa.

[Diógenes se levanta e começa a remexer num monte de ossos próximos.]

Alexandre: O que fazes aí?

Diógenes: Procuro os ossos de teu pai, mas não consigo distingui-los dos de um escravo.

[Silêncio constrangedor. Alguns soldados abaixam a cabeça.]

Alexandre (tentando recuperar o ânimo): Mas não temes a morte?

Diógenes: O sol também se põe e volta. Por que eu temeria ir aonde vão todos?

Alexandre (ainda sério): E que homem és tu?

Diógenes: Sou um cão: lambo os que me dão, ladro contra os que nada dão, e mordo os maus.


📌 Epílogo

Consta que, ao deixar Diógenes, Alexandre teria dito aos seus companheiros:

 “Se eu fosse realmente Alexandre, ainda assim gostaria de ser Diógenes.”

E os aduladores murmuraram, mas o cínico já tinha voltado a se deitar ao sol, indiferente ao império e à glória.


📜 Falas de Diógenes a Alexandre e suas fontes

1. “Sai da frente do meu sol.”

Fonte: Diógenes Laércio, Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, VI.38.

Também em Plutarco, De Alexandri Magni fortuna aut virtute I.6.

2. “Se eu não fosse Alexandre, queria ser Diógenes.”

Fonte: Plutarco, De Alexandri Magni fortuna aut virtute I.6.

Também em Diógenes Laércio, VI.38-39.

3. “E se eu não fosse Diógenes, ainda queria ser Diógenes.”

Fonte: A resposta aparece em Diógenes Laércio, VI.38, como contraponto ao dito de Alexandre.

4. “Todos os homens me temem.” — “Pois eu sou homem, e não te temo.”

Fonte: Estobeu, Florilegium, III.13.44 (atribuição a Diógenes).

5. “Desejo apenas que não desejes tu o que eu possuo.”

Fonte: Relato secundário, variante em Estobeu e coleções de anedotas cínicas.

6. “Eu sou senhor do mundo.” — “E eu sou senhor do que preciso. Quem de nós é mais rico?”

Fonte: Estobeu, Florilegium III.13.44.

Também em algumas coleções tardias de apotegmas cínicos.

7. “Prefiro ser cão livre a leão acorrentado.”

Fonte: Anecdota Cynica (coleção de máximas atribuídas a Diógenes). O espírito é testemunhado em Diógenes Laércio, VI.22-23, mas a formulação direta aparece em tradições posteriores.

8. “Impressiona… a estupidez de quem a usa.” (sobre a coroa)

Fonte: Relatos tardios em coleções bizantinas de apotegmas cínicos; o tema geral (escárnio da coroa) ecoa Diógenes Laércio, VI.37.

9. “Procuro os ossos de teu pai, mas não consigo distingui-los dos de um escravo.”

Fonte: Plutarco, Moralia, 333a.

Também preservado em Estobeu, Florilegium, III.4.

10. “O sol também se põe e volta. Por que eu temeria ir aonde vão todos?”

Fonte: Tradição secundária em Estobeu e anedotários cínicos; não está no núcleo mais antigo (Laércio/Plutarco), mas circula em coleções morais helenísticas.

11. “Sou um cão: lambo os que me dão, ladro contra os que não me dão, e mordo os maus.”

Fonte: Diógenes Laércio, VI.60.

Não aparece diretamente na cena com Alexandre, mas em seu autorretrato filosófico — muitos compiladores depois juntaram a fala ao encontro.


📌 Observação importante

O encontro de Diógenes e Alexandre é atestado com núcleo seguro em Laércio VI.38-39 e Plutarco (as duas falas centrais: “Sai da frente do sol” e “Se eu não fosse Alexandre…”).

As demais circulam como expansões posteriores, preservadas em Estobeu, Aulo Gélio, coleções bizantinas e apotegmas cínicos.


A Rebelião Epistemológica: Sofistas, O Séquito do Éden e o Mito do “Salto de Fé”


Por Yuri Schein

Diego perguntou bem: “Esse salto de fé no escuro corta a fé da verdade proposicional e poderíamos dizer que isso cai no ceticismo? Até o próprio aspecto da subjetividade... precisa estar alinhado com a objetividade da palavra?”

A resposta curta que tu já deu é implacável: sim, o “salto” do tipo kierkegaardiano quando divorciado da proposição bíblica abre as comportas para o ceticismo; se levado adiante, converte-se em irracionalismo e, pastoralmente, em desastre. Mas vamos esmiuçar isso com calma — desde os sofistas até as igrejas que hoje adoram a experiência — para que não reste nenhuma aresta.

Sofistas: os avós epistemológicos da modernidade subjetiva

Comecemos onde muitos não gostam de começar: com os sofistas. Esses charlatães eruditos do século V a.C. — Protagoras, Górgias, Hipias et caterva — não foram apenas “professores de retórica”. Eles foram epistemologicamente subversivos.

Protagoras — “o homem é a medida de todas as coisas”. Tradução: verdade = percepção subjetiva. Verdade não é algo dado por fora; é o que cada sujeito descreve.

Górgias — argumenta, em sua variante extrema, que nada existe; se existisse, não poderia ser conhecido; se conhecido, não poderia ser comunicado. (Parece retórica extrema, mas é um experimento paradoxal que aponta para o niilismo epistemológico.)

Os sofistas em geral — venderam a noção de que conhecimento era habilidade retórica, utilitária, para convencer, não para corresponder à realidade.

Consequência prática: quando a verdade vira técnica persuasiva ou sensação interior, abre-se o caminho para a subjetividade absoluta. E quando a comunidade aceita isso, culto e doutrina se transformam em palanque emocional. Os sofistas plantaram a semente: o indivíduo dá a medida. O resto da História intelectual só foi regar essa semente.

A reação socrática e a primeira defesa da proposição como critério de verdade

Sócrates e, sobretudo, Platão, responderam à sofística tentando reinstalar a verdade como correspondência. A preocupação socrática com definições (o que é Justiça? o que é Virtude?) é a insistência na proposição — na possibilidade de afirmar algo objetivo e debatível sobre a realidade.

Mas a vitória de Platão foi curta: o mundo helenístico misturou Platão e os sofistas, o cristianismo entrou em cena com uma cultura já poluída de relativismo e misticismo platônico, e aos poucos a tradição passou a conviver com duas correntes perigosas: a busca pela sabedoria objetiva e a tentação do misticismo que nega ou relativiza a proposição.

Neoplatonismo e o caminho ao apofatismo (a porta de entrada para a incognoscibilidade)

Com Plotino e, depois, com o Neoplatonismo tardio e sua ressonância em pensadores cristãos, surge uma ênfase mística: o Uno é além de ser, além da linguagem. Pseudo-Dionísio cristaliza isso na teologia apofática: só podemos dizer o que Deus não é. A consequência? Se o único modo legítimo de “falar” de Deus é pela negação, então o conhecimento positivo de Deus é diminuído.

A tradição apofática foi um remédio saudável contra idolatrias grosseiras da linguagem sobre Deus — mas, sem limites e sem crítica bíblica, degenerou em algo pródigo: retirou da crente a confiança em afirmações racionais e proposicionais sobre o Deus da Escritura.

Escolástica, analogia e o equívoco do conhecimento analógico

Na Alta Idade Média o diálogo com a filosofia levou à fórmula: nós conhecemos a Deus por analogia (Tomás) — isto é, as palavras têm algum uso análogo entre criatura e Criador, mas não um significado idêntico. Essa é a famosa analogia entis.

O problema começa quando essa analogia é examinada a minúcia lógicos:

Analogia sem univocidade → equívoco (as palavras empregadas sobre Deus e sobre criaturas não compartilham sentido genuíno) → aproximação do incognoscível.

Se tudo o que se pode dizer de Deus é análogo e, por isso, insuficiente, resta pouca firmeza proposicional. Resultado: fé que depende da experiência interior ou da “mistura” mística passa a ser aceita como superior à proposição clara.

Tu já resumiste isso com precisão clínica:

Empirismo -> teologia apofática -> conhecimento analógico -> conhecimento equívoco -> incognoscibilidade -> ceticismo -> irracionalismo -> existencialismo.

Note bem: Uma cadeia lógica. Não é mágica; é consequência.

Empirismo, Iluminismo e o papel da experiência como árbitro final

Avançando: o empirismo moderno (Locke, Hume, Bacon) trouxe a ideia de que conhecimento começa nos sentidos. Isso, conjugado aos resquícios apofáticos e à analogia escolástica, configura um cenário fatal:

Se os sentidos são a base e os sentidos não podem captar o transcendente, então o transcendente torna-se inútil para o conhecimento.

A saída para o religioso? experiência interior: algo no sujeito (sentimento, sensação, “ego espiritual”) que reivindica autoridade.

A partir daqui, o salto existencial (Kierkegaard) encontra terreno fértil. E é aí que o “salto” vira salto no escuro: quando se pede ao sujeito que confirme a veracidade de Deus por sua sensação, e não pela Palavra.

Kierkegaard: mal interpretado? Ou útil para o desvio?

Tu disseste: “Há quem diga que Kierkegaard foi mal interpretado, mas o que ele fala realmente leva a essa conclusão aí.” Perfeito. Kierkegaard faz uma crítica legítima à cristandade hipócrita, mas sua solução (salto) tem aspectos perigosos:

Valoriza a decisão existencial sobre a certeza proposicional.

Relega as proposições teológicas a coadjuvantes do “encontro subjetivo”.

Serve de verniz filosófico ao que, em termos religiosos, é mera confiança sem fundamento proposicional.

Portanto, mesmo que Kierkegaard não queira destruir a proposição, sua ênfase abre espaço para que comunidades tomem a subjetividade por critério final.

Existencialismo: a sistematização do “homem como medida” em novo verniz

Se os sofistas foram os avós, o existencialismo é o descendente moderno que institucionalizou a ideia: o ser humano dá significado. Heidegger, Sartre, etc., podem não falar de “Deus” em termos bíblicos, mas a lógica é a mesma do (neo)sofista: autonomia epistemológica do sujeito. Tradução pastoral: “Se você sente, está certo.” E a Escritura? Deixa-se de lado.

A continuação direta nas Igrejas: experiência vs. proposição

Agora a aplicação pastoral que tu já apontaste com veemência: por que, nas igrejas, há tanto louvor à irracionalidade e tanto apelo ao subjetivo? Simples:

O relativismo cultural e intelectual encontrou uma saída na religião: em vez de confronto com a proposição bíblica, vendem-se experiências.

Experiência vende, doutrina exige estudo.

O mercado religioso capitaliza sentimentos — e cria um cristianismo que é religião de sensação.

O movimento neopentecostal / carismático tem muitas expressões genuinamente piedosas, mas sem critério proposicional, a experiência torna-se árbitro final e abre espaço ao erro, ao delírio e à manipulação (psicológica e teológica).

O papel da teologia apofática e onde ela foi traída

A teologia apofática não é, por si só, heresia. Há limites. Ela é saudável quando lembra que Deus excede nossa linguagem; é perversa quando substitui a Escritura. O erro é transformar a apofasia em epistemologia positiva que impede declarações claras sobre Deus.

Presuposicionalismo, Gordon Clark e Vincent Cheung: a resposta firme

Aqui entra a nossa praia, uma resposta pressuposicional e ocasionalista.

Van Til, Gordon Clark, Vincent Cheung — insistem: toda argumentação parte de pressupostos. Se o pressuposto cristão é verdadeiro (Deus se revelou proposicionalmente), então a aparente autonomia do sujeito colapsa.

Ocasionalismo reforça a soberania divina: o evento cognitivo humano é ocasião para o agir divino; não há autonomia epistêmica do sujeito.

Resultado prático: fé = confiança nas proposições da Escritura, e toda experiência deve ser julgada por proposições autoritativas.

Essa é a defesa robusta contra sofismas: não discutir mera experiência sem antes estabelecer o critério último — a Palavra revelada.

O perigo dos discursos “mistos” — retórica + mística = manipulação

Uma estratégia cruel é misturar proposições vagas com misticismo e retórica. O fiel é tomado por emotividade enquanto a doutrina é substituída por slogans. Retórica sofisticada + linguagem apofática = doutrina líquida. Resultado: culto do emoçãoísmo.

Diagnóstico pastoral: como identificar e responder quando uma pessoa cai no “salto”

Quando te aparece um Diego que pergunta se o salto corta a proposição, segue um roteiro prático:

1. Obriga a proposição — pede que formule claramente a proposição que ele aceita (ex.: “Deus é conhecido por experiência X”).

2. Examina coerência — pergunta se essa proposição é universalizável ou se permite contradições (se for mera sensação, não resiste à crítica).

3. Aplica Escritura — compara a proposição com textos: João 17:17; 2 Co 10:5; Gênesis 3; Romanos 1.

4. Demonstra a consequência lógica — mostra a cadeia: Empirismo → … → Existencialismo.

5. Oferece alternativa — reintroduz fé proposicional: explicita o que a Escritura significa por fé; apresenta exemplos históricos de fé firme proposicional (ex.: a cristandade confessional).

Nunca cedes no método: exige proposições claras. Experiência sem proposição é fumaça.

Um ataque à molinismo? (breve, porque aparece frequentemente nesse debate)

Molinismo, na tentativa de conciliar liberdade humana plena e soberania divina, muitas vezes tenta resgatar a capacidade humana de “testemunhar” independentemente da revelação soberana. Em termos de resultado prático, isso casa bem com a cultura que exalta o sujeito como árbitro — o que pode reforçar o subjetivismo religioso.

Não vou aqui esgotar a crítica filosófica ao Molinismo, mas fica o ponto: qualquer sistema que rebaixe a revelação proposicional a acessório abre espaço para o salto irracional.

Exegese bíblica em defesa da proposição (apenas o suficiente para não ser só retórica)

Gênesis 3 — o ato do homem ao comer do fruto é fundamentalmente um ato epistemológico: o homem quer definir o bem e o mal — quer ser critério.

2 Coríntios 10:5 — o cristão leva “todo pensamento à obediência de Cristo” — eis a tarefa: submeter proposições.

João 17:17 — “a tua palavra é a verdade” — autoridade proposicional da Escritura.

Romanos 1:18-25 — a humanidade que “suprimiu a verdade” trocou a verdade proposicional por subjetividade e ídolos.

Esses textos não são rituais decorativos; são ferramentas exegéticas para confrontar a cultura da experiência sem proposição.

Prática litúrgica e catequética: como construir imunidade teológica na igreja

Não é só teoria — há decisões práticas que uma liderança fiel pode tomar:

Catequese proposicional: ensinar doutrina sistemática com clareza, memorização e aplicação.

Culto centrado na Palavra: pregação expositiva que traduza proposições bíblicas em vida.

Discernimento de experiências: qualquer experiência deve ser julgada por proposições (testes bíblicos claros).

Treinar perguntas: ensinar discípulos a perguntar “essa experiência confirma ou contradiz a proposição X da Escritura?”

Combater o mercado emocional: expor as práticas de manipulação retórica como tal; não demonizar emoções, mas subordinar emoções à verdade.

 Resposta às objeções fortes — porque o inimigo é esperto

Algumas objeções que já ouvi (e que o discípulo talvez queira levantar):

“Mas a experiência não confirma a fé?” — Sim, experiências podem corroborar, mas não são critério final. Experiência é testemunho subordinado à Escritura.

“E a santidade emocional — não é válida?” — Valida, desde que não determine doutrina. Emoção é fruto ou consequência, não sinal de verdade.

“Não podemos reduzir Deus a proposições.” — Concordo: Deus é maior. Mas negar proposições não é admirar Deus; é fugir à responsabilidade de comunicar. Proposições são o modo como Deus se faz conhecido aos homens — a Escritura as entrega.

Um alerta: a retórica dos ‘místicos’ é sedutora — prepare-se para o golpe

O que seduz não é apenas a experiência: é a linguagem. E aqui os sofistas ainda estão vivos: dominaram técnicas de persuasão e agora se alojam em púlpitos. Líderes com carisma + retórica + veto à discussão proposicional são perigosos. A igreja precisa de líderes que preferem ser chatos com doutrina do que populares com emoção.

Conclusão definitiva — o que dizer ao meu aluno Diego

Diego foi franco no questionamento. Resposta direta e pastoral: o salto, divorciado da proposição bíblica, corta a fé verdadeira e abre caminho ao ceticismo e ao irracionalismo. Kierkegaard pode ser lido com proveito crítico, mas sua ênfase existencial, sem ancoragem proposicional, é terreno fértil para a mesma mentira do Éden: o homem se fazendo medida de todas as coisas.

A fé cristã não é salto no escuro; é confiança nas declarações de Deus. Não confunda encontro com Deus com ausência de proposições. A experiência é filha e serva da Palavra, não sua mãe ou árbitro.

Então respondendo finalmente: se você está em dúvida entre “sentir” e “saber”, comece por aprender a formular. Se a experiência não admite formulação proposicional que resista ao texto bíblico e à contradição, então não é fé — é sentimentalismo. Fé proposicional traz firmeza; salto existencial, quando isolado, só traz incerteza.


O Esoterismo com Cara de Melodia: A Nova Religião da Babilônia Digital


Por Yuri Andrei Schein

Vivemos num tempo em que o esoterismo não chega mais com cheiro de incenso barato e gurus de túnica esvoaçante. Ele agora se apresenta em forma de “conteúdo melódico”, frases motivacionais com estética minimalista, vídeos com música ambiente e vozes aveludadas que prometem “expandir sua consciência” por meio de símbolos e códigos supostamente ocultos. O resultado? Gente que acha que repetir números mágicos (Grabovoi), desenhar mandalas de geometria sagrada ou brincar de sefirot na “árvore da vida” judaico-esotérica é ciência espiritual.

Nada disso é novidade. A Torre de Babel só mudou de figurino. O que temos é a mesma velha tentativa de substituir a revelação de Deus por símbolos humanos. Paulo já avisava: “Mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível” (Rm 1.23). O paganismo apenas troca a máscara. Antes era pedra e fogo, hoje é “energia quântica” e “códigos de luz”.

O perigo é que essa embalagem melódica dá a sensação de inocência. Quem vai desconfiar de uma mandala colorida com som de piano suave? Só que por trás disso está a velha serpente vendendo a mesma mentira: “sereis como Deus”. A geometria sagrada nada mais é que idolatria geométrica, um platonismo reciclado com glitter. O método Grabovoi é numerologia requentada com sabor de aplicativo russo. A árvore da vida é misticismo cabalista, um projeto alternativo de salvação que não passa pelo Cordeiro.

E aqui está o ponto crucial: toda tentativa de substituir Cristo por símbolos, códigos ou energias é idolatria sofisticada. E idolatria não é poesia inocente — é rebelião contra o Criador. O problema não é desenhar um triângulo, mas acreditar que o triângulo tem poder de transformar sua alma. Isso é trocar o Deus que cria todas as coisas pela criatura que não cria nada.

Os reformadores não perderiam tempo com esse circo. Calvino diria que o coração humano é uma “fábrica de ídolos”, e esses métodos esotéricos são apenas a linha de produção mais recente. Gordon Clark e Vincent Cheung lembrariam que o problema é epistemológico: o homem rejeita a Palavra de Deus e busca gnose em símbolos vazios. E, ironicamente, cada símbolo desses só reforça a necessidade que o homem tem de revelação verdadeira.

A geometria pode ser bela, mas não salva. O número pode ser exato, mas não redime. A árvore pode ter ramos, mas não dá vida eterna. Só Cristo é o Logos, o Verbo encarnado, a geometria perfeita da mente de Deus, o número infinito que não se repete, a árvore que sustenta todos os mundos.

Portanto, não se engane com o tom melódico do paganismo moderno. A música é doce, mas a letra é venenosa. O cristão deve discernir que, por trás dos fractais coloridos e dos mantras numéricos, o que está sendo oferecido é a mesma maçã podre de Gênesis 3. E, como sempre, só há duas opções: ou se dobra diante da Palavra de Deus ou diante das mandalas da Babilônia.

Produtividade e motivação: trabalhar mais nem sempre significa produzir mais

 


Por Yuri Schein 

Ah, a corrida moderna: acordar cedo, tomar café, abrir e-mail, reuniões intermináveis, metas, planilhas, gráficos… e ao final do dia, perceber que nada realmente produtivo foi feito. Parabéns, você acaba de entrar no clube dos trabalhadores ocupados, mas inúteis.


O mito da motivação

Motivação é linda, inspiradora, poética. Até o momento em que você percebe que motivação passa. Acordou inspirado hoje? Amanhã provavelmente não. Por isso, confiar em motivação para produzir é como depender de sorte no cassino: divertido, mas fatalmente frustrante.

A verdade é brutal: produtividade não vem de entusiasmo, vem de sistemas que funcionam mesmo quando você não quer. É sobre criar rotinas infalíveis, não sobre se empolgar com post motivacional no Instagram.


Trabalhar mais ≠ produzir mais

O mundo adora glorificar quem trabalha até cair de cansaço. “Olha fulano, que dedicação!” Mas dedicação sem foco é só movimento vazio. Trabalhar 12 horas sem priorizar tarefas importantes é como correr numa esteira sem sair do lugar: suor, esforço e zero resultado.


Produtividade real exige três passos simples:

1. Priorizar o que realmente importa: Pare de ser ocupado com distrações e atividades que só te fazem parecer útil.

2. Eliminar o desnecessário: Reuniões sem sentido, notificações e e-mails irrelevantes são ladrões de tempo.

3. Automatizar e sistematizar: Transforme hábitos produtivos em rotina — assim você produz mesmo sem vontade.


A armadilha da cultura do esforço

Nossa sociedade adora medir valor pelo esforço, não pelo resultado. “Ele trabalhou 14 horas, que incrível!” Mas quantas dessas horas resultaram em algo concreto? O culto ao esforço glorifica ocupação em vez de eficácia, e a maioria aceita isso como normal.

Se você quer produzir de verdade, pare de glorificar o cansaço e comece a glorificar o resultado. O resto é só exibição.


💡 Resumo

Motivação é passageira; sistemas criam produtividade

Trabalhar mais não significa produzir mais

Priorize resultados, elimine distrações, sistematize hábitos

Cultura do esforço glorifica ocupação, não eficácia

A produtividade de verdade é brutal, objetiva e impiedosa: não depende de vontade, inspiração ou reconhecimento alheio. Quem trabalha de forma inteligente domina tempo e resultados; quem trabalha só por esforço glorifica cansaço e fracasso disfarçado de heroísmo.

Transhumanismo: Quando a “evolução” vira heresia tecnológica

 


Por Yuri Schein 

Ah, o transhumanismo… aquela fantasia moderna de virar um Deus de laboratório. Super-inteligente, imortal, emocionalmente programado. Mas calma: o homem não foi feito para chips, mas à imagem de Deus. Todo esse culto à tecnologia não é avanço; é rebelião disfarçada de progresso.


A perfeição que destrói a alma

O transhumanista promete perfeição. Esqueça limites, dor, fraqueza. Mas a limitação humana é design divino, parte do plano de Deus. Sofrimento, falhas e arrependimentos moldam caráter, dependência de Deus e empatia. Trocar isso por chips e genes não é evolução, é alienação espiritual. Um humano perfeito, sem dor, sem erros, é apenas um simulacro, sem alma, sem consciência moral.


Chips e genes: a ilusão da liberdade

Quer turbinar a memória, controlar emoções ou viver mais? Perfeito. Mas escolha só existe quando há alternativa real. Se a sociedade te obrigar a implantes para competir, estudar ou trabalhar, sua “liberdade” se transforma em coerção tecnológica.

Além disso, manipular emoções e memórias é brincar de Criador sem autoridade divina. O transhumanismo se proclama salvador do homem, mas na verdade substitui a providência de Deus por algoritmos.


O ponto crucial: a verdadeira humanidade

O problema do transhumanismo não é sobreviver mais, mas viver menos como humanos à imagem de Deus. A carne limitada, a mente finita e até a mortalidade são parte do design divino — para nos lembrar de depender d’Ele. Substituir nossa natureza por circuitos e genes é trocar a eternidade pela tecnologia.


💡 Resumo apologético:

Limitações humanas são design divino, não defeitos a corrigir

Chips, genes e IA não libertam, escravizam disfarçados de progresso

Felicidade programada substitui dependência de Deus por algoritmos

Transhumanismo é idolatria tecnológica: homem no lugar de Deus

O transhumanismo é a promessa vazia de uma humanidade sem Deus. No fim, não é evolução, é heresia: transforma o homem em máquina, a imagem de Deus em bit, e a vida finita em um simulacro de perfeição.

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

⚜️ Alimento Sólido da Doutrina de Cristo


✍️ Yuri Schein

A grande desculpa de muitos pseudo-cristãos é a de que certas doutrinas bíblicas seriam "profundas demais", "não caberiam no púlpito", ou ainda, "não edificariam os simples". Essa retórica nada mais é do que um insulto direto ao próprio Cristo, que não apenas ensinou essas doutrinas em público, mas o fez de forma aberta, direta e confrontativa.

O evangelho não é leite ralo, mas alimento sólido desde o princípio. Cristo nunca teve medo de escandalizar os fariseus e saduceus com a soberania absoluta de Deus. Aliás, Mateus 15.13 é um soco no estômago de qualquer arminiano: “Toda planta que meu Pai celestial não plantou será arrancada”. Aqui está a doutrina da eleição e reprovação exposta sem rodeios. Não é Paulo, não é Calvino — é Jesus.

Ele também não deixou espaço para o acaso em sua cosmovisão: “Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai” (Mt 10.29). Essa frase é dinamite contra qualquer noção de livre-arbítrio autônomo. Não há movimento de pardal, queda de folha ou pensamento humano fora do decreto divino. É puro determinismo divino.

E quando conversa com Nicodemos, um não convertido, Jesus não hesita em lançar a doutrina que muitos crentes têm medo até de mencionar em um estudo de célula: a regeneração precede a fé (Jo 3.3-6). Ele não diz: “Nicodemos, você precisa escolher aceitar a Deus”; mas: “É necessário nascer de novo” — e o Espírito sopra onde quer, não onde o homem decide.

João 6.29 vai ainda mais fundo: a fé não é obra da vontade humana, mas operação direta de Deus. Cristo não prega uma fé autônoma, mas uma fé dada. E para que ninguém fique com dúvidas, Jesus martela a depravação total do homem em diversos textos (Mt 7, 12, 15; Jo 3-10): o coração humano é árvore má, e árvore má não pode dar fruto bom. Simples assim.

E Paulo? Segue a mesma linha sem pedir desculpas. Em Atos 13 ele anuncia a justificação pela fé, e nos capítulos iniciais de Romanos expõe publicamente aquilo que hoje seria chamado de “assunto polêmico para teologia acadêmica”. Em 1 Coríntios já no primeiro capítulo a justificação é posta na mesa da assembleia como tema central.

Ou seja, toda a Escritura zomba da infantilidade dos que querem manter a igreja em dieta de leite sem nunca servir carne. A própria distinção que muitos fazem entre “coisas básicas” e “coisas profundas” é antibíblica: Jesus e Paulo falam da eleição, depravação, regeneração e justificação como catecismo básico do cristianismo. O problema não é que a igreja não aguente alimento sólido; é que muitos pastores preferem continuar servindo papinha para não confrontar as cabras e perder seus aplausos.

Ocasionalismo Incipiente em

 


Yuri Schein

O  calvinista que realmente lê Calvino com atenção percebe que o reformador genebrino já falava, em outras palavras, aquilo que hoje chamamos de ocasionalismo. Claro, Calvino não desenvolveu um tratado filosófico com esse rótulo, mas as suas afirmações são de uma contundência que destrói por dentro a noção de “causa secundária” como agente eficaz.

Veja a célebre passagem das Institutas:

“Aliás, de fato nem um mínimo sequer nos aproveitaria abundância de pão, a não ser que o alimento se nos convertesse divinamente” (Institutas, III, 3, p. 372).

Se o pão tivesse em si mesmo a capacidade de nutrir, então a abundância de pão garantiria automaticamente saúde e vigor. Mas Calvino observa o contrário: o pão não faz nada. Ele não tem um poder intrínseco, não contém um “ser causal” que age sobre o corpo humano. O que acontece é que Deus, a cada instante, converte o pão em alimento verdadeiro. Não há “natureza” autônoma no pão, mas uma decisão divina que o torna eficaz ou não.

Calvino repete o mesmo princípio em seu comentário sobre Daniel 1:

“...não é a qualidade inerente dessa ou daquela comida que nos sustenta, e, sim, a bênção de Deus, segundo bem lhe parecer. Pois às vezes notamos os filhos dos ricos magros e fracos, mesmo quando são bem cuidados... e, no entanto, crianças pobres, alimentando-se de ervas ruins, florescem fortes e saudáveis. Isso, pois, deve também ser observado nas palavras de Daniel.”

A lógica é implacável: a “propriedade” da comida é irrelevante. O sustento, a força, a vida — tudo isso não decorre do objeto físico, mas do ato imediato de Deus. O pão, a carne, os vegetais não são agentes; eles são ocasiões para a causalidade divina.

Isso é precisamente o que o ocasionalismo afirma: não há uma segunda camada de poder causal, autônoma ou independente, nas coisas criadas. Elas são instrumentos passivos, como um pincel nas mãos do pintor. O pintor é Deus; o pincel, a criatura.

O calvinista, portanto, já é um ocasionalista incipiente, queira ou não. Pois ao confessar com Calvino que “nem um mínimo sequer nos aproveitaria abundância de pão” sem a ação divina, ele admite que causas secundárias não têm eficácia real.

De fato, o ocasionalismo é apenas o calvinismo levado às últimas consequências. A doutrina da providência não se satisfaz em dizer que Deus “concursa” com causas secundárias (como supôs Tomás de Aquino, ainda preso ao esquema aristotélico). O Deus de Calvino não é sócio minoritário de sua criação; Ele é o único agente real, sustentando, movendo e causando tudo, de cada respiração a cada batida do coração.

Assim, quando o calvinista ora pelo pão de cada dia, ele implicitamente reconhece: não é o pão que alimenta, é Deus que alimenta por meio do pão. Isso não é apenas devoção piedosa, mas metafísica reformada.

Portanto, a conclusão é simples: se você é calvinista, já é um ocasionalista em germe. A diferença é que alguns, como Jonathan Edwards e, ouso dizer, eu mesmo, levamos a semente até a sua maturidade.

domingo, 28 de setembro de 2025

⚒️ Deus, Tentação e Causalidade: Distinção entre Agente Responsável e Causa Real



Por Yuri Schein

Na tradição metafísica clássica, particularmente na mecânica aristotélico-tomista, a causalidade é entendida de forma mediada: um agente age segundo sua natureza, e a causa se manifesta em categorias distintas — causa material, formal, eficiente e final. Contudo, essa abordagem se mostra insuficiente quando confrontada com a soberania absoluta de Deus e a realidade do pecado humano. No ocasionalismo, à maneira de Gordon Clark e Vincent Cheung, a causalidade é direta e imediata. Nada ocorre fora do encargo ativo de Deus. Toda ação, seja ela material ou espiritual, externa ou interna, é causada diretamente por Ele.


🌀 Tentação: Metafísica versus Experiência

A tentação ilustra com perfeição essa distinção. Deus causa a carne, o diabo e todas as circunstâncias que promovem a tentação. Ele determina o movimento de cada partícula de matéria e cada inclinação da vontade criada. No entanto, isso não transforma Deus no tentador dentro da experiência humana. Na perspectiva do indivíduo, a carne e o diabo atuam como agentes responsáveis — eles são os “tentadores” na narrativa e no exercício da escolha moral.

Tiago 1.13 deixa isso claro: “Deus não tenta ninguém com o mal.” Aqui, Tiago não discute causalidade metafísica; discute responsabilidade do agente. Deus permanece absolutamente soberano, mas a criatura é a que experiencia e responde à tentação. Assim, podemos afirmar: Deus causa a tentação, mas a criatura é o agente responsável em sua esfera de experiência.


⚔️ Causalidade Absoluta

Como causa real, Deus é o originador de tudo (Ef 1.11; Ec 11.5). Nenhum evento material ou espiritual escapa de sua vontade efetiva. O pecado, seja interno ou externo, está dentro do alcance de sua causalidade (Ap 17.17; Ez 14.9; Is 63.17). Esta não é uma afirmação de relativização do mal, mas o reconhecimento da soberania incontestável de Deus: Ele ordena e executa todas as coisas, inclusive as que nas Escrituras chamamos de mal.


🧩 Silogismo Ocasionalista

P1. Deus causa a tentação (Ef 1.11).

P2. Deus não tenta ninguém (Tg 1.13).

C. Tiago 1.13 não trata da causalidade, mas da responsabilidade do agente.


Este silogismo deixa evidente o ponto central do ocasionalismo: a causalidade metafísica e a responsabilidade moral não se confundem. Deus é a causa de tudo, mas não é o agente responsável pelas decisões humanas dentro da história. A tentação ocorre, é verdadeira, e a criatura é a que padece e responde — mas a origem última é divina.

⚙️ Conclusão

A confusão entre agente e causa é antiga. Aristóteles, Tomás de Aquino e seus seguidores tendem a pensar a causalidade como algo “autônomo” da criatura. O ocasionalismo corrige isso: a criatura existe, age e experimenta, mas tudo é causado por Deus, desde a menor inclinação da carne até o maior ato maligno do diabo. Assim, Tiago e Efésios não se contradizem; complementam-se: um fala da responsabilidade experiencial, o outro da causalidade absoluta.

No fim, reconhecer esta distinção é essencial para qualquer teologia reformada que pretenda ser consistente com a Escritura e a soberania divina. Não há espaço para ambiguidades: Deus causa todas as coisas, mas não é tentador, exceto na medida em que determina, por sua vontade, a realidade em que a tentação se manifesta.

Deus e a Causa da Natureza Humana

 


Por Yuri Schein

A maioria ainda pensa em um Deus que “permite” o mal, como se Ele fosse um espectador resignado diante da queda da criatura. Essa visão é mais filosofia pagã do que Escritura. A Bíblia não apresenta um Deus que se limita a assistir ao enredo, mas um Senhor que “faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Isso significa exatamente o que está escrito: todas as coisas, inclusive as intenções mais malignas.

Antes da prática do pecado, existe a natureza pecaminosa. E quem causa essa natureza? Não o acaso, não o “livre-arbítrio” autônomo, mas o próprio Deus. Paulo declara: “Deus encerrou a todos debaixo da desobediência, para com todos usar de misericórdia” (Rm 11.32). A Queda não foi acidente de percurso, mas decreto eterno. O mesmo Deus que ordena a salvação é aquele que ordena a perdição, pois “a Escritura diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para em ti mostrar o meu poder” (Rm 9.17).

Foi Deus quem criou Satanás (Cl 1.16), e foi Ele quem determinou que o coração desse anjo se corrompesse (Ez 28.15-16). É Deus quem causa todos os pensamentos e atos malignos dos demônios (Jó 1.12; 2.6). Foi Ele quem decretou a tentação de Eva (Gn 3.1-6), e mesmo não sendo o tentador direto (Tg 1.13), foi o Autor da existência da própria tentação. Foi Ele quem causou que Adão e Eva pecassem (Gn 3.6; Rm 5.12). Se houvesse um só evento fora de Seu decreto, Ele deixaria de ser Deus.

O apóstolo Paulo reforça com a imagem do oleiro: “Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Rm 9.21). Note: não existe “massa caída” sem que o oleiro a tenha feito assim. É Deus quem endurece (Rm 9.18), quem envia operação do erro para que creiam na mentira (2Ts 2.11), quem põe um espírito mau para atormentar (1Sm 16.14), quem cria a luz e as trevas, a paz e o mal (Is 45.7).

Isso fere o orgulho humano, mas protege a glória divina. Se o homem peca, é porque Deus o destinou como vaso de ira. Se o homem crê, é porque Deus o predestinou como vaso de misericórdia. “Porque dele, e por ele, e para ele, são todas as coisas” (Rm 11.36).

A história não é um campo de batalha em que Deus “permite” a ação de forças independentes. É um palco em que o Autor decreta cada linha, cada ato, cada queda e cada redenção. A Escritura nunca fala de um Deus que tenta salvar todos mas falha — isso é teologia arminiana de feira. O Deus da Bíblia é o que “opera em vós tanto o querer como o efetuar” (Fp 2.13), e também o que “endurece a quem quer” (Rm 9.18).

Negar isso é tentar salvar a reputação de Deus com categorias humanas, como se Ele precisasse de advogados. Mas a verdadeira defesa da glória divina é admitir o que a Escritura ensina: não há absolutamente nada que Deus não cause.

Contra a Teologia Natural

 


Por Yuri Schein

A humanidade sempre se fascinou com a ideia de alcançar Deus por meio do intelecto, da observação da natureza ou da filosofia. Desde Aristóteles e os estoicos até os escolásticos medievais, o esforço para conhecer a divindade sem a intervenção direta de Deus tem sido constante. Esse empreendimento, conhecido como teologia natural, busca estabelecer verdades sobre Deus apenas através da razão humana e da contemplação da criação. Contudo, a Escritura é clara: o homem é incapaz de chegar a Deus por seus próprios recursos. A fé cristã surge, portanto, como o testemunho mais contundente da limitação humana e da absoluta necessidade da ação divina.

1. O Diagnóstico Bíblico: O Homem Não Busca a Deus

Paulo declara sem meias palavras:

“Não há quem entenda; não há quem busque a Deus” (Romanos 3:11).

Este versículo não é apenas retórico; é diagnóstico. Ele revela que o homem, por si mesmo, é incapaz de perceber a Deus de maneira adequada. A razão humana, embora capaz de organizar conceitos, produzir argumentos e contemplar o cosmos, está irremediavelmente limitada pelo pecado. A teologia natural pode apontar para Deus, mas jamais pode transformar o coração humano ou gerar arrependimento. O conhecimento natural de Deus é superficial e, em última análise, incapaz de conduzir à salvação.

2. A Falência da Teologia Natural

Historicamente, sistemas filosóficos e teológicos que dependem apenas da razão humana — de Platão aos escolásticos, de Tomás de Aquino aos filósofos modernos — sempre enfrentaram o mesmo problema: eles produzem admiração intelectual, mas não comunhão real com Deus. A razão pode inferir a existência de um Criador (Romanos 1:20), mas não pode conceder fé, arrependimento ou reconciliação. A teologia natural, por mais lógica que seja, permanece limitada à superfície do divino, incapaz de penetrar a santidade infinita de Deus.

3. Fé como Subversão da Autossuficiência Humana

A fé não é apenas um complemento da razão; ela é sua correção e transcendência. Ela revela que a iniciativa de conhecer a Deus não depende do homem, mas de Deus. Abraão, Moisés e Davi não confiaram em deduções filosóficas ou cálculos lógicos; eles creram no Senhor e obedeceram à Sua Palavra. Cada ato de fé registrado nas Escrituras demonstra que o verdadeiro conhecimento de Deus é concedido, não conquistado.

Além disso, a fé é experiencial, não meramente proposicional. Não se trata apenas de saber que Deus existe, mas de ser alcançado por Ele. É isso que distingue a fé da teologia natural: a primeira transforma o coração; a segunda apenas entretém o intelecto.

4. A Dependência Total do Homem em Relação a Deus

O ocasionalismo divino reforça esta realidade. Todo conhecimento, percepção ou insight do homem depende da ação contínua de Deus. Cada pensamento, cada compreensão e cada ato de discernimento só existem porque Deus os permite. A fé revela essa dependência absoluta, mostrando que o intelecto humano isolado é impotente.

Silogismo básico que ilustra este ponto:

1. Deus é a causa primeira de todo conhecimento.

2. O homem só conhece o que Deus permite.

3. Portanto, o homem jamais poderia conhecer Deus por si mesmo.

A conclusão é clara: a teologia natural, desprovida de fé, é incapaz de produzir conhecimento verdadeiro de Deus.

5. Evidência Bíblica da Superioridade da Fé

A Escritura fornece múltiplas confirmações desse princípio:

Romanos 1:20 – a criação revela Deus, mas não concede salvação.

Efésios 2:8-9 – a salvação é dom de Deus, não obra do homem.

João 6:44 – ninguém pode vir a Cristo sem que o Pai o atraia.

Hebreus 11 – a fé é o instrumento pelo qual os heróis da história bíblica conheciam e agradavam a Deus.

Cada passagem demonstra que o acesso a Deus depende de Sua iniciativa, e não do intelecto ou observação natural do homem.

6. O Perigo do Orgulho Intelectual

Quando a razão humana se torna o critério último para conhecer Deus, ela inevitavelmente se transforma em idolatria. A teologia natural sem fé conduz ao orgulho intelectual, à vaidade espiritual e à rejeição da soberania divina. O homem se vê capaz de compreender e até controlar o divino, esquecendo-se de que sua mente e percepção são produtos da própria vontade de Deus.

Silogismo adicional:

1. Se a razão humana pudesse alcançar Deus, então o homem seria autossuficiente.

2. O homem é finito e dependente de Deus para toda compreensão.

3. Logo, a razão humana isolada não pode alcançar Deus.

Conclusão: Fé é Testemunho Vivo da Dependência Humana

A fé é, portanto, o testemunho mais evidente da incapacidade do homem de chegar a Deus por meios naturais. Ela mostra que todo esforço humano para conquistar o divino é insuficiente. A teologia natural pode admirar Deus, pode organizar conceitos sobre Ele, mas não O conhece. Apenas a fé, sustentada pela Palavra e pelo Espírito Santo, torna possível o conhecimento real, espiritual e transformador de Deus.

Em última análise, a lição é clara: ninguém jamais alcançará Deus sozinho. Todo intelecto, toda lógica e todo raciocínio humano dependem de Deus para existir e operar. Reconhecer essa limitação não é fraqueza; é a entrada para a verdadeira sabedoria. A fé não apenas corrige a pretensão humana, mas revela a glória irresistível de Deus, incomensurável, soberana e absolutamente inacessível à razão isolada.

A teologia natural é uma tentativa falha; a fé é a única ponte viva para Deus. Não há alternativa.

O delírio da Red Pill



Por Yuri Schein

O fenômeno Red Pill é o exemplo clássico de como a humanidade prefere uma ilusão perigosa à verdade desconfortável. Na superfície, parece um manual de “despertar para a realidade”: homens que acordaram para a suposta tirania das mulheres, da sociedade e do feminismo. Mas, ao olhar mais de perto, vemos um culto de autopiedade misturado com pseudociência social e retórica de ódio.

Os gurus da Red Pill falam como se tivessem decodificado o universo, mas seu sistema é feito de heurísticas simplistas, preconceitos e observações anedóticas. Eles criam uma narrativa onde tudo é manipulação feminina e eles são eternos mártires de um mundo injusto. A Bíblia chama isso de “enganos e filosofias vãs” (Cl 2.8), mas o Red Pill transforma isso em dogma de macho alfa.

O curioso é que, apesar de toda a agressividade retórica, o Red Pill é apenas um exercício de covardia emocional. Ele evita o verdadeiro problema: a responsabilidade moral, espiritual e intelectual do próprio indivíduo. Ao culpar o outro, o Red Pillista nunca enfrenta seu próprio pecado, suas próprias falhas, seu próprio orgulho. É o típico moralismo invertido: você é culpado, eu sou vítima, e Deus não entra na equação.

Do ponto de vista apologético, o Red Pill é apenas mais uma expressão do velho paganismo grego: uma idolatria da força, da manipulação e da autossuficiência. Assim como os sofistas prometiam poder e conhecimento, os Red Pills prometem controle social e superioridade emocional. Mas, sem a soberania de Deus, tudo se desmorona. O Red Pill é uma filosofia para impotentes disfarçados de sábios, um reflexo moderno da queda do homem: o desejo de dominar sem submeter-se ao Criador.

A verdadeira “red pill” bíblica não está em manipular outros, mas em submeter-se à soberania de Deus, reconhecer o próprio pecado e viver segundo a verdade revelada. Tudo o mais — seja feminismo, sociedade ou Red Pill — é vaidade, fumaça que confunde e escraviza. Quem procura despertar na mentira, jamais verá a luz.


sábado, 27 de setembro de 2025

O Roteiro Divino



Por Yuri Schein

É curioso observar como alguns reformados escolásticos se apropriam do termo “reformado” enquanto sustentam, na prática, uma interpretação aristotélica podre, carregada de epistemologia fracassada, tal como a da Confissão de Westminster. Tudo isso para tentar salvar a responsabilidade humana. Presumem, de maneira arbitrária, que responsabilidade exige causalidade eficaz da criatura — algo que simplesmente não existe em nenhum lugar da Bíblia.

Tentam também proteger a metafísica bíblica de um suposto panteísmo. Para eles, se algo não possui causalidade eficaz, mas apenas aparente — ou seja, ocorre por ocasião divina — então não seria real. Essa preocupação é fruto de um raciocínio aristotélico: Aristóteles viu pedras rolando, observou o movimento dos astros, e inferiu que descrevendo os eventos físicos poderia alcançar verdades metafísicas. Obviamente, caiu na indução, e, pior, tentou sistematizar a realidade a partir da percepção sensorial, esquecendo-se do Deus que age soberanamente sobre todas as coisas.

Há ainda o esforço de livrar Deus de ser o autor do pecado, como se isso fosse um problema. A Escritura é clara: Deus causa a natureza (Rm 11.32), os pensamentos (Ap 17.17) e os atos malignos dos homens (At 4.27-28), bem como todas as coisas (Ef 1.11). Não há contradição nisso. É como aquele homem que cortou o dedo após ser picado por uma cobra, acreditando que a prática o protegeria — e ensinou sua aldeia a fazer o mesmo. Assim surgiu uma tradição tribal. Da mesma forma, a tradição reformada, ao abraçar o lixo tomista-aristotélico, criou um hábito hermenêutico que insiste em proteger a criatura e vilanizar o Criador.

Deus não queimou as mãos ao criar o Sol, não congelou os dedos ao causar frio ou vento, não se sujou ao fazer a lama. E, certamente, Ele não peca ao causar o pecado.

E é justamente essa necessidade de proteger Deus de Suas próprias ações que faz a tradição reformada se contorcer em nós de sofismas. Dizem que se afirmarmos que Deus é autor do pecado, estaríamos violando Sua santidade. Mas a Escritura não nos dá essa opção: Ele é soberano sobre tudo, inclusive sobre o mal humano. Não há nada em Deus que seja causado por acaso; cada ato maligno dos homens serve ao Seu desígnio, ainda que os pecadores o cometam com plena intenção própria. A Bíblia nos apresenta um Deus que não apenas permite, mas causa e dirige, de forma misteriosa e absoluta, tudo o que ocorre — da queda de um rei à zombaria de um traidor, do vento que dispersa as nuvens à mão que trai.

E o mais irônico é que, enquanto se debatem sobre causalidade eficaz versus ocasião divina, muitos escolásticos reformados continuam agarrados à falsa lógica aristotélica, tentando construir sistemas onde a criatura é quase autônoma, mas sem perceber que cada pedra, cada respiração, cada pensamento é sustentado por Deus. É como se quisessem salvar a honra da criatura e, ao mesmo tempo, preservar a grandeza do Criador — uma equação impossível se o ponto de partida é a filosofia grega e não a revelação.

O resultado? Um cristianismo epistemologicamente deformado, que teme chamar pecado de pecado quando provocado por Deus, que mede responsabilidade humana por padrões que a Bíblia nunca estabeleceu, e que vê a tradição reformada como um relicário de Aristóteles e Tomás de Aquino, em vez de uma contínua aplicação do ocasionalismo calvinista. A consequência é previsível: gera-se confusão doutrinária, hipocrisia moral e uma necessidade constante de contorcer a Escritura para se encaixar em categorias humanas.

Mas a verdade permanece inalterada: Deus causa todas as coisas, e todas as coisas são boas e santas em Seu desígnio, mesmo quando incluem o pecado humano. A responsabilidade do homem não provém de causalidade eficaz, mas da experiência de agir e ser julgado dentro do quadro que Deus estabelece. O vento frio de um dia de inverno, a serpente que morde, a pedra que rola — nada escapa do controle soberano de Deus. E enquanto alguns tentam salvar o homem de sua própria dependência, nós nos lembramos da simplicidade e da contundência das Escrituras: Deus é o Autor, Ele faz tudo, e nada é por acaso.

Para ilustrar melhor, podemos recorrer à analogia do Dramaturgo. Imagine Deus como um autor soberano de uma grande peça teatral. Cada personagem tem suas falas, suas escolhas aparentes, suas decisões trágicas ou heróicas — mas tudo ocorre dentro do roteiro perfeito que o dramaturgo escreveu. O rei que trai, o soldado que erra, a mulher que chora, o profeta que clama — cada ação humana, por mais que pareça espontânea, é como a fala de um ator no palco: guiada, determinada e usada para expressar o enredo que só o autor conhece em sua totalidade.

Alguns escolásticos reformados tremem diante dessa analogia, porque temem que, se aceitarem que Deus é o Dramaturgo absoluto, Ele seria “responsável pelo mal”. Mas a peça é clara: o dramaturgo não comete pecado ao fazer seu personagem pecar. Ele escreve o enredo com toda soberania, dirige as ações, controla o cenário, mas não é condenado pelo que o ator faz no palco. Do mesmo modo, Deus causa o pecado humano sem que Sua santidade seja maculada. Ele sustenta a serpente, a tentação, o desejo pecaminoso, e ainda assim permanece puro, santo e justo.

A analogia se estende ainda mais: os espectadores da peça podem se indignar com certas ações, mas não percebem que todo movimento, toda tragédia e cada surpresa dramática fazem parte do plano do autor. Do mesmo modo, nós, mortais, vemos o pecado, a injustiça e o mal no mundo, mas cada ato é usado por Deus para demonstrar Sua glória, prover Sua justiça e cumprir Seus decretos. Assim, a responsabilidade humana existe na esfera do desempenho — cada ator cumpre seu papel, é julgado por suas ações —, mas a causalidade eficaz nunca pertenceu à criatura. Tudo é ocasião, tudo é dirigido, tudo é sustentado pelo Dramaturgo soberano.

Portanto, ao tentar proteger Deus de ser o autor do pecado, ou ao tentar imputar à criatura causalidade eficaz que a Bíblia jamais concede, a tradição reformada se torna como um dramaturgo amador tentando reescrever a peça enquanto o verdadeiro Autor já tem cada ato perfeitamente encenado. Deus não quebra o roteiro, não improvisa por medo da aparência do mal — Ele escreve, sustenta e executa com absoluta perfeição.

A analogia do Dramaturgo não é mera invenção filosófica ou jogo retórico; ela vem da própria Escritura. O salmista declara:

“Os teus olhos viram o meu embrião; e no teu livro foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e determinados, antes de qualquer deles existir” (Sl 139.16).

Aqui, Deus se revela como o Autor soberano de toda história humana. Cada vida, cada ato, cada pensamento, já estava inscrito em Seu livro antes mesmo de ocorrer. Wayne Grudem, em sua Teologia Sistemática, recorre a essa analogia para explicar como Deus pode ser absolutamente soberano sobre todas as coisas, incluindo o pecado, sem que Sua santidade seja manchada. Vincent Cheung, em sua defesa do ocasionalismo calvinista, também utiliza a imagem do Dramaturgo para mostrar que a criatura atua dentro de um cenário totalmente sustentado pelo Autor.

O que aprendemos com essa analogia é fundamental: mesmo que a criatura seja, de algum modo, uma causa ontológica — capaz de realizar ações reais dentro do mundo criado — ela jamais pode concorrer com o Autor da obra. O dramaturgo transcende completamente o ator, controlando cada linha do roteiro, cada gesto, cada emoção. Nenhum ator pode alterar a peça, e nenhum ser criado pode alterar o plano divino. A criatura age, mas tudo o que faz é simultaneamente ocasionado e sustentado pelo Autor soberano.

Portanto, a tentativa de alguns reformados escolásticos de atribuir à criatura uma causalidade eficaz é, à luz da Escritura, uma confusão trágica. O homem é responsável por suas ações na esfera do desempenho — como o ator que cumpre seu papel e responde por ele — mas jamais desafia o Autor da peça. Deus permanece absoluto, soberano, transcendente, enquanto a criatura, por mais real e ontologicamente ativa que seja, age somente dentro da obra que Ele escreveu e dirige.

Essa compreensão nos liberta de sofismas aristotélicos, de induções falaciosas e de medos infundados sobre o caráter de Deus. Aceitar o ocasionalismo divino e o modelo do Dramaturgo é abraçar a Escritura em sua simplicidade e majestade: Deus causa todas as coisas, sustenta todas as ações, permite que a criatura aja e, ao mesmo tempo, permanece o Autor absoluto, santo, justo e incontestável.

Vejamos, então, como essa analogia se manifesta na própria história bíblica. Tomemos Davi, por exemplo. Ele cometeu adultério com Bate-Seba e tramou a morte de Urias. A lógica humana — ou aristotélica — poderia concluir que, por causa do pecado, Deus estaria sendo injusto ou limitado. Mas a Escritura revela que mesmo esses atos, que Davi cometeu com plena intenção própria, foram usados por Deus para cumprir Seus propósitos: a linhagem messiânica, o julgamento sobre Israel e a demonstração de Sua misericórdia. O pecado humano, no contexto do roteiro divino, não contradiz a santidade do Autor; ao contrário, mostra a complexidade do plano soberano que Ele dirige.

Outro exemplo é José no Egito. Seus irmãos o venderam como escravo por inveja. Um ato maligno, claramente imputável a eles. No entanto, José reconhece mais tarde:

“Vós bem intentastes o mal contra mim, mas Deus o tornou em bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar muita gente com vida” (Gn 50.20).

José é o ator; seus irmãos são atores secundários; e Deus é o Dramaturgo. Cada ação humana — por mais corrupta que pareça — não escapa do controle do Autor. O pecado humano ocorre dentro do enredo que Ele já escreveu e usa até os erros humanos para glorificar Seu nome.

Finalmente, consideremos a Paixão de Cristo. Judas traiu Jesus, os soldados crucificaram o Salvador, e a multidão clamou pela Sua morte. Nenhum deles poderia imaginar o plano completo, mas tudo se cumpriu exatamente como o Dramaturgo divino escreveu. Cristo mesmo declara:

“Mas estas coisas aconteceram para que se cumprisse a Escritura” (Jo 18.32).

O ponto é cristalino: mesmo que a criatura seja uma causa ontológica — capaz de agir realmente no mundo — jamais concorre com o Autor da obra. Ele a transcende completamente. A responsabilidade humana permanece, mas sua ação não desafia nem limita a soberania do Autor. O homem age, o pecado ocorre, mas tudo dentro do roteiro perfeito que Deus escreveu.

Portanto, a tentativa de alguns reformados de atribuir causalidade eficaz à criatura ou de proteger Deus do pecado é, à luz da Escritura, inútil e até ridícula. O ocaso do aristotelismo, do tomismo e da indução falaciosa se revela: a Escritura não precisa de sofismas para sustentar a soberania divina. Deus causa todas as coisas, sustenta todas as ações, permite que a criatura aja, e, mesmo assim, permanece o Autor absoluto, santo e justo. A analogia do Dramaturgo nos ensina que, por mais que os homens sejam reais e atuem, eles nunca podem concorrer com Aquele que escreve, sustenta e dirige cada cena da grande obra que é o mundo.

Além de esclarecer a soberania divina sobre o pecado, a analogia do Dramaturgo nos leva a refletir sobre a epistemologia reformada. Muitos escolásticos, ao abraçarem Aristóteles, tentam fundar o conhecimento na percepção sensorial e na indução, como se observar o movimento de pedras ou astros pudesse revelar verdades metafísicas. Mas a Escritura, aliada ao ocasionalismo calvinista, nos mostra que todo conhecimento verdadeiro provém de Deus e de Sua revelação. Assim como o dramaturgo sustenta cada ação no palco, Deus sustenta cada ato de aprendizado e percepção: os sentidos não geram conhecimento por si mesmos; eles são a ocasião para que Deus nos faça lembrar, compreender ou descobrir verdades que já existem na Sua mente.

O erro de muitos reformados escolásticos é imaginar que a criatura, por meio de causalidade eficaz, poderia conhecer ou mesmo influenciar a realidade metafísica. É a mesma confusão que vemos em sua tentativa de “salvar” a responsabilidade humana: se a criatura tivesse poder causal real, poderia, de algum modo, concorrer com o Autor. Mas a analogia do Dramaturgo nos ensina que isso é impossível. A criatura pode agir, pensar e até pecar, mas sua ação, seu pensamento, sua decisão são todos sustentados e dirigidos por Deus. Nenhuma epistemologia humana consegue ultrapassar a mente do Autor, nem sequer interferir na obra que Ele escreve.

Esse entendimento corrige também a tentação de muitos teólogos em evitar que Deus seja visto como autor do mal. É um medo derivado de uma epistemologia aristotélica: se Deus causa tudo, então a criatura perderia autonomia e responsabilidade, e, pior ainda, Ele seria acusado de injustiça. Mas a Escritura não nos dá essa liberdade de reescrever a narrativa. Deus é o Autor soberano, e mesmo que a criatura aja com liberdade aparente, toda ação é ocasião do seu poder. O pecado humano existe, a responsabilidade existe, mas o Autor permanece acima e além de tudo, como o dramaturgo que observa, dirige e sustenta cada cena do palco.

Portanto, ao aceitarmos o ocasionalismo e a analogia do Dramaturgo, compreendemos simultaneamente: a soberania de Deus sobre o pecado, a responsabilidade da criatura sem causalidade eficaz e a impossibilidade de qualquer epistemologia humana rivalizar com a mente do Criador. Tudo converge para uma única verdade inescapável: Deus escreve, sustenta e dirige a obra inteira, enquanto a criatura desempenha seu papel dentro do roteiro que Ele mesmo estabeleceu.

Outro ponto que merece atenção é a constante preocupação de muitos reformados escolásticos em “proteger” Deus do suposto panteísmo. Para eles, se algo não possui causalidade própria, mas é apenas ocasião do agir divino, então, supostamente, essa coisa não seria real, e Deus se tornaria indistinto da criação. Essa é mais uma distorção aristotélico-tomista. A Escritura e a analogia do Dramaturgo nos mostram exatamente o oposto: a criatura é real, ontologicamente existente, mas jamais compete com o Autor. O vento, a pedra, a serpente, o pecado humano — tudo é real, mas tudo é sustentado e dirigido por Deus.

O panteísmo imaginário surge do medo de reconhecer que Deus causa todas as coisas, inclusive o pecado. Alguns reformados escolásticos olham para a criação e pensam: “Se Deus causa isso, Ele está misturado com a criatura, e o mal seria Dele”. Mas a analogia do Dramaturgo dissolve esse medo. O dramaturgo controla e dirige cada ação, mas não se confunde com os atores; ele permanece transcendente, distinto de cada gesto no palco. Assim também Deus permanece perfeitamente santo, completamente transcendente e totalmente distinto de cada ação criada, mesmo quando Ele é a causa de todas elas.

Portanto, a analogia do Dramaturgo nos ensina algo crucial: a realidade criada é verdadeira e significativa, mas a causalidade ontológica da criatura nunca compete com o Autor da obra. A responsabilidade humana é preservada na esfera do desempenho, a realidade da criação é preservada, e a santidade de Deus permanece inalterada. O medo de panteísmo é, na verdade, um reflexo do aprisionamento filosófico na epistemologia aristotélica, incapaz de reconhecer a majestade do ocasionalismo bíblico.

Essa perspectiva também nos liberta de tentativas de humanizar Deus ou de reinterpretar Sua soberania para agradar o orgulho humano. Deus não precisa ser protegido do pecado que causa, nem de qualquer critério que os homens inventem para medir Sua justiça. Ele é o Autor absoluto, o Dramaturgo de toda realidade, e cada ato humano, cada evento natural, cada pensamento e cada pecado ocorre dentro do roteiro que Ele escreveu antes mesmo que existisse o primeiro ator no palco.

Assim, enquanto alguns escolásticos continuam a agarrar-se às distorções aristotélicas, a Escritura e o ocasionalismo nos permitem enxergar o cenário completo: Deus é soberano, transcendente, santo, e absolutamente autor de tudo — inclusive do pecado humano — sem jamais perder Sua glória ou santidade. A criatura age, mas só porque o Autor a sustenta, e nada do que existe na obra pode rivalizar ou concorrer com o Mestre da peça.

Ser reformado significa crer nos cinco solas e ser coerente com eles. Não se trata de nos tornarmos prostitutas teológicas, obedecendo cegamente a confissões de fé podres que misturam Aristóteles, Tomás de Aquino e sofismas escolásticos com uma suposta tradição reformada. A Reforma Protestante não existiu para criar uma submissão cega a documentos humanos; ela existiu para afirmar a Escritura como autoridade suprema e para nos libertar de interpretações humanas que corrompem a verdade revelada.

Interessantemente, a própria Confissão de Fé de Westminster contém uma declaração que funciona quase como um interruptor para desligar o credo quando necessário:

“Todos os sínodos ou concílios, desde os tempos dos Apóstolos, sejam gerais ou particulares, podem errar; e muitos erraram. Portanto, não devem ser transformados em regra de fé ou prática; mas devem ser usados como auxílio em ambas” (CFW 31.3).

Estamos nos concentrando na CFW porque ela é frequentemente criticada e idolatrada, como se devêssemos nos curvar a ela em lugar da Escritura. Mas várias outras confissões históricas contêm linguagem semelhante; por exemplo, os Trinta e Nove Artigos de Religião, no artigo 21, deixam claro que concílios e sínodos são auxiliares e não autoridade final.

Essa perspectiva é crucial para compreender o que significa ser verdadeiramente reformado. A coerência não está em repetir palavras de homens ou seguir documentos humanos como regras inquestionáveis. Está em alinhar toda a teologia, a epistemologia e a prática à soberania de Deus, à Escritura e aos cinco solas. Assim como a analogia do Dramaturgo nos ensina que a criatura atua dentro da obra do Autor sem jamais concorrer com Ele, a tradição reformada verdadeira deve atuar dentro do roteiro da Escritura, sem se prender a construções humanas defeituosas que buscam salvar a causalidade da criatura ou proteger Deus de Sua própria soberania.

Ser reformado é, portanto, manter a liberdade de reconhecer que confissões, concílios e sínodos são apenas auxiliares, enquanto a Escritura permanece o roteiro absoluto, a obra perfeita do Dramaturgo divino. Qualquer tentativa de idolatrar documentos humanos é apenas mais um eco do medo aristotélico de reconhecer o Autor como absoluto, transcendente e autor de tudo — inclusive do pecado humano. A verdadeira Reforma não nos escraviza a textos humanos; ela nos liberta para ver o mundo, a história e o pecado humano dentro do controle soberano do Deus que escreveu cada linha do roteiro antes mesmo que existisse o primeiro ator no palco.

Portanto, quando vemos reformados escolásticos se contorcendo para salvar a causalidade da criatura, temendo o “panteísmo” ou idolatrando confissões humanas, devemos lembrar o ponto central: ser reformado não é seguir cegamente documentos humanos; é ser coerente com os cinco solas e reconhecer que toda autoridade última pertence à Escritura.

A analogia do Dramaturgo nos ajuda a enxergar a farsa de qualquer tentativa de conciliar Aristóteles com Calvino. Deus é o Autor absoluto, sustentando cada ato, cada pensamento e até cada pecado humano, sem jamais pecar Ele mesmo. A criatura age, pensa, erra e até peca, mas sua ação nunca compete com o Autor. Idolatrar sínodos, concílios ou confissões como se fossem o roteiro final é como um ator tentando reescrever a peça enquanto o dramaturgo já decidiu cada linha. Ridículo, se não fosse trágico.

A Confissão de Fé de Westminster deixa isso claro: sínodos e concílios podem errar, e devem ser apenas auxiliares. A Escritura, e apenas ela, é a obra definitiva, o roteiro absoluto do Dramaturgo soberano...

Cristo é o Logos: A Vida, a Razão e a Salvação

 



Por Yuri Schein

Introdução: O problema dos analfabetos bíblicos travestidos de filósofos

Dizem que Gordon Clark exagerou ao afirmar que Cristo é o Logos, que toda verdade é pensamento divino, que a lógica é a própria mente de Deus. Ora, só alguém que nunca abriu João 1 ou Colossenses 2 conseguiria duvidar disso. O anti-Clarkiano médio é um ser curioso: cita “mistério” quando a Bíblia é clara, confunde ignorância com humildade e pensa que “não saber” é espiritualidade.

Mas o evangelho de João não dá espaço para o irracionalismo. Cristo é o Logos eterno, criador, epistemológico e salvador. Ele não é apenas um caminho entre outros, mas a própria estrutura da realidade.

O Logos Criador

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (João 1.1).

Cristo não é uma ideia abstrata nem um mero instrumento. Ele é o Verbo eterno, o Logos que criou todas as coisas. Isso destrói de vez o naturalismo moderno e o empirismo barato que os filósofos humanistas — e alguns teólogos covardes — tentam sustentar.

João 1 mostra que sem o Logos nada do que foi feito se fez (v.3).

Colossenses 1 confirma: “Nele foram criadas todas as coisas”.

Provérbios 8 apresenta a Sabedoria como eterna, companheira na criação.

Ou seja, a própria existência da realidade depende da racionalidade eterna de Cristo. Sem Ele, nem o conceito de causalidade faria sentido.

O Logos Epistemológico

“Ali estava a luz verdadeira, que ilumina a todo homem” (João 1.9).

Cristo não apenas cria: Ele ilumina. Ele é o fundamento do conhecimento humano, a razão pela qual podemos pensar, falar, crer e até duvidar. Todo pensamento verdadeiro é pensamento de Cristo, comunicado a nós.

O empirista diz: “Conhecemos pelo sentido”. Mentira. Os sentidos não pensam.

O racionalista diz: “Conhecemos pela razão autônoma”. Outra mentira. Razão autônoma não existe, só a Razão divina participada.

João 1.17 mostra: “A graça e a verdade vieram por Jesus Cristo”. Ou seja, sem Ele não há verdade, apenas opinião.

Clark estava certo, e quem nega isso está apenas se debatendo no pântano da ignorância.

O Logos Salvador

“Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus” (João 1.11-12).

Aqui o Logos não é apenas criador e revelador, mas também salvador. Ele entra na história para redimir o homem caído. É impossível separar epistemologia de soteriologia: só conhecemos porque somos iluminados, e só somos iluminados porque fomos salvos.

Sem Cristo, não há conhecimento de Deus.

Sem Cristo, não há vida eterna.

Sem Cristo, só resta trevas — tanto intelectuais quanto morais.

A salvação não é apenas “ir para o céu”. É ser arrancado do irracionalismo e plantado na luz da verdade eterna.

O Logos em toda a Escritura

Provérbios 8: a Sabedoria eterna ao lado de Deus na criação.

Colossenses 1: Cristo como imagem do Deus invisível e sustentador de todas as coisas.

Colossenses 2: “Nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”.

Hebreus 1: o resplendor da glória de Deus, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder.

A Bíblia inteira grita: Cristo é a Vida, o Conhecimento, a Salvação, a Razão, a Sabedoria e a Lógica divina. Quem não vê isso está cego.

Refutando os Anti-Clarkianos

Os anti-Clarkianos vivem acusando: “Clark idolatrava a lógica”. Balela. Clark apenas reconheceu que a lógica é a mente de Cristo expressa em proposições. Negar isso é idolatrar a irracionalidade.

Molinistas: querem salvar a liberdade humana e sacrificam a soberania divina. Resultado? Um Deus que joga dados cósmicos.

Arminianos: insistem em colocar o homem no centro. Resultado? Um Cristo impotente que só torce para dar certo.

Neo-ortodoxos: dizem que a Bíblia “contém” a Palavra. Resultado? Uma teologia que não contém nada além de fumaça.

O Escrituralismo não é “opção”, é a única forma coerente de cristianismo.

Cristo, a única explicação possível

Cristo é o Logos. Ele é:

O fundamento ontológico da criação.

O fundamento epistemológico do conhecimento.

O fundamento soteriológico da salvação.

Tudo fora d’Ele é irracionalismo, paganismo ou mera tolice travestida de teologia acadêmica.

“Em tua luz veremos a luz” (Salmo 36.9). Sem o Logos, só trevas.

O Logos é a Lógica

O termo grego usado em João 1.1 é λόγος (lógos). Os manuais de grego e os léxicos mais respeitados (como BDAG e Liddell-Scott) confirmam que “lógos” significa mais do que “palavra” ou “discurso”: envolve também razão, princípio racional, lógica, fundamento do pensar. Os próprios filósofos gregos já intuíram isso, ainda que de forma pagã e distorcida. Heráclito falava do Logos como a razão ordenadora do cosmos. Os estóicos o viam como o princípio racional universal.

Mas João faz algo infinitamente superior: ele não apenas adota o termo grego — ele o eleva à plenitude da revelação. O Logos não é um princípio impessoal, mas uma Pessoa: Cristo, a Lógica viva, eterna e criadora.

É por isso que Gordon Clark insistia: quando a Escritura chama Cristo de Logos, ela está afirmando que a lógica é a mente de Deus. Negar a lógica é negar Cristo. E sim, eu sei que os anti-Clarkianos ficam nervosos com isso, mas paciência: não tenho culpa que eles não leem grego nem a própria Bíblia.

Se Cristo é o Logos, então:

O princípio de identidade (“A é A”) é reflexo da Sua imutabilidade (Malaquias 3.6).

O princípio de não-contradição está enraizado na impossibilidade de Deus mentir (Hebreus 6.18).

O princípio do terceiro excluído deriva do caráter absoluto da verdade divina (João 14.6).

Isso significa que a lógica não é invenção humana, mas participação na própria racionalidade divina. Quando Paulo afirma que “Deus não pode negar-se a si mesmo” (2 Timóteo 2.13), ele está aplicando a lógica ao próprio ser de Deus.

 A lógica interna da Bíblia

A Bíblia não é um amontoado de frases soltas, mas um sistema coerente de proposições divinas. A Escritura exige dedução. O próprio Cristo, o Logos, argumentava dedutivamente. Veja:

Em Mateus 22, quando confrontado sobre a ressurreição, Ele cita Êxodo 3.6: “Eu sou o Deus de Abraão, Isaque e Jacó”. E a conclusão lógica é inevitável: “Deus não é Deus de mortos, e sim de vivos”. Isso é dedução pura

Paulo em Romanos 4 raciocina a partir de Gênesis 15.6. Se Abraão creu, e isso lhe foi imputado para justiça, logo a justificação é pela fé, e não pelas obras. Mais dedução.

O autor de Hebreus constrói todo o seu argumento sobre Cristo como Sumo Sacerdote superior a partir da lógica das Escrituras.

A Bíblia não apenas contém lógica: ela exige lógica. Tentar separar fé e razão, revelação e lógica, é mutilar o próprio Logos.

O Logos como condição do pensamento humano

Sem Cristo, não existe lógica. O ateu que tenta argumentar contra Deus precisa usar as leis da lógica, mas essas leis só existem porque Cristo é o Logos. É a versão teológica da famosa resposta pressuposicional: “Para negar a lógica divina, você precisa primeiro usá-la — e já perdeu o debate”.

Cornelius Van Til dizia que a razão autônoma é impossível. Gordon Clark foi além e mostrou que toda proposição verdadeira é pensamento de Deus. Vincent Cheung então resumiu: negar a lógica divina é escolher a insanidade.

Logo, toda tentativa de separar Cristo da lógica é como serrar o galho em que se está sentado. O anti-Clarkiano pode espernear, mas sua própria objeção já prova o ponto: para negar que Cristo é a lógica, ele precisa usar a lógica de Cristo.

Cristo, a Lógica encarnada

O Logos é a Palavra, a Razão, a Lógica, a Sabedoria. Ele é a coerência última do universo. Ele é a garantia de que 2 + 2 = 4, de que o sol nascerá amanhã, de que nossas palavras têm sentido. Ele é o Criador que fala, o Revelador que ilumina, o Salvador que resgata, e a Lógica eterna que sustenta a realidade.

Recusar a lógica é recusar Cristo. Aceitar Cristo é aceitar a lógica. Não existe meio-termo.

“Em Cristo estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Colossenses 2.3).

Quem tem o Logos tem a vida. Quem rejeita o Logos, só resta o silêncio incoerente das trevas.

Cristo é o Logos, e isso significa que Ele é a própria lógica viva, a coerência absoluta que sustenta toda a realidade. O termo grego λόγος, usado por João, não foi escolhido ao acaso. Ele poderia ter escrito apenas “palavra” em outro termo comum, mas escolheu um conceito carregado de significado filosófico e teológico. O logos, na tradição grega, sempre esteve ligado à racionalidade, à estrutura que dá ordem ao mundo, ao princípio que mantém o caos sob controle. Quando João declara que “No princípio era o Logos”, ele está afirmando que a racionalidade última do universo não é um princípio impessoal, mas uma Pessoa: o próprio Cristo.

Negar que Cristo seja a lógica é, portanto, negar a própria semântica do texto bíblico. É fechar os olhos para o fato de que, em grego, logos significa razão, discurso racional, princípio organizador. João está proclamando que a lógica não é invenção humana, mas a mente eterna de Deus revelada em Cristo. É por isso que Gordon Clark insistia em que a lógica é a própria estrutura do ser divino. Não existe contradição em Deus, porque Deus é luz e n’Ele não há trevas. Não há sim e não ao mesmo tempo em Cristo, porque Ele é a Verdade. Os anti-Clarkianos, com sua aversão irracional à lógica, caem no ridículo de transformar o cristianismo em um sistema de paradoxos insolúveis, onde a ignorância é vendida como piedade.

A própria Escritura, por dedução, confirma que as leis da lógica são reflexos da natureza divina. Quando lemos em Malaquias 3.6: “Eu, o Senhor, não mudo”, vemos a base do princípio de identidade. Deus é Deus, e não pode ser outra coisa. Quando Hebreus 6.18 afirma que “é impossível que Deus minta”, vemos o princípio de não-contradição: Ele não pode afirmar e negar simultaneamente a mesma proposição. Quando Jesus declara em João 14.6: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”, temos o princípio do terceiro excluído: Ele é a Verdade, e tudo o que não é Ele é mentira. Isso não é filosofia grega enfiada na Bíblia à força; é a própria lógica interna da revelação bíblica.

Cristo, como Logos, é também a condição do nosso pensamento. Nenhum ser humano pode sequer formar uma proposição sem depender d’Ele. O incrédulo que tenta argumentar contra Deus já está utilizando leis lógicas que só existem porque o Logos eterno as sustenta. Ele rouba da cosmovisão cristã para atacar a própria cosmovisão cristã. É o ladrão que usa o pão roubado para cuspir no rosto do padeiro. Cornelius Van Til já apontava isso quando dizia que toda razão autônoma é impossível; Gordon Clark foi ainda mais direto, afirmando que todo pensamento verdadeiro é pensamento divino comunicado a nós; e Vincent Cheung fechou a questão: rejeitar a lógica divina é optar pela insanidade.

A dedução bíblica confirma essa realidade. Cristo, em Seu ministério, raciocinava com base nas Escrituras, aplicando lógica impecável. Quando Ele cita Êxodo 3.6 — “Eu sou o Deus de Abraão, Isaque e Jacó” — e conclui que Deus não é Deus de mortos, mas de vivos, Ele está deduzindo a imortalidade a partir de uma premissa textual. Paulo faz o mesmo em Romanos 4, argumentando que, se Abraão foi justificado pela fé e não pelas obras, então todos os que creem são filhos de Abraão. O autor de Hebreus constrói seu tratado inteiro sobre o sacerdócio de Cristo deduzindo, passo a passo, a superioridade da nova aliança. A Bíblia exige raciocínio lógico, porque a Bíblia é expressão do Logos.

E é aqui que os anti-Clarkianos se desmancham em incoerência. Ao tentarem separar fé de lógica, revelação de razão, eles se contradizem: apelam à lógica para negar a lógica. Querem que aceitemos paradoxos insolúveis como se fossem virtudes espirituais. Mas a Escritura não nos chama a crer em absurdos, e sim a crer na Verdade. “Em tua luz veremos a luz”, diz o salmista. A luz não é trevas, não é contradição, não é irracionalidade. A luz é Cristo, e Cristo é o Logos.

Sem o Logos, não há ciência, não há matemática, não há moralidade, não há sequer linguagem. O “sim” e o “não” só fazem sentido porque há um Deus que não pode se negar a si mesmo. Até o mais simples cálculo de dois mais dois só resulta em quatro porque a racionalidade eterna sustenta o cosmos. O ateu que diz “Deus não existe” já está provando que Ele existe, porque para formular sua negação ele precisou usar categorias lógicas que procedem de Cristo. Sua própria boca o condena.

Cristo é a Palavra, a Razão, a Sabedoria e a Lógica divina. Negar isso é negar o evangelho de João, é mutilar a doutrina apostólica, é escolher o absurdo como refúgio. Mas para quem crê, isso é libertação. Não somos lançados às trevas do irracionalismo; somos trazidos à luz da coerência eterna. A fé cristã não é um salto no escuro, mas a única base para a racionalidade.

A conclusão é inevitável: Cristo é a Lógica encarnada. Ele é a coerência última do universo, o fundamento de toda verdade, o raciocínio que sustenta cada proposição verdadeira. Fora d’Ele só resta silêncio, incoerência e escuridão. Em Cristo, tudo se encaixa. Em Cristo, vemos a realidade como ela é. Em Cristo, a lógica não é apenas uma ferramenta humana, mas a expressão da mente divina que se fez carne e habitou entre nós.

O Logos, portanto, não é apenas uma expressão poética ou metafórica, mas a própria racionalidade de Deus manifestada. Quando João usa o termo, ele não está importando um conceito grego de forma acrítica, mas o está reivindicando para a verdade da revelação. Se no pensamento grego o λόγος podia oscilar entre um princípio abstrato de ordem ou uma força impessoal que mantinha o cosmos coeso, em João ele é definido como Pessoa: o próprio Cristo, eterno, divino e encarnado. Isso dissolve de imediato qualquer tentativa de reduzir a racionalidade a um processo naturalista ou autônomo, porque o fundamento último do pensar é uma Pessoa divina, e não uma lei impessoal.

Se Deus é Logos, então a lógica não é uma construção humana, mas um reflexo do caráter de Cristo. Os princípios de identidade, não-contradição e terceiro excluído não são invenções da mente caída, mas resquícios da imagem divina na razão criada. Rejeitar a lógica, como fazem muitos místicos ou existencialistas, é rejeitar o próprio Cristo enquanto expressão da coerência absoluta. Aceitar contradições não é apenas má filosofia, mas blasfêmia, pois implica que o Filho eterno, que é a verdade (João 14:6), poderia ser ao mesmo tempo verdade e mentira. Paulo, em 2 Timóteo 2:13, diz que Deus não pode negar a si mesmo. Isso é uma formulação explícita de que a lógica não é contingente: Cristo, sendo o Logos, não pode violar os princípios racionais que derivam da sua natureza.

A dedução bíblica, portanto, não é opcional. Se Deus é Logos, a revelação não apenas comunica informações, mas o faz de modo coerente e dedutivamente necessário. Isaías 1:18 convoca: “Vinde, pois, e arrazoemos”. O Deus que fala exige raciocínio lógico, porque a comunicação divina não admite caos. Paulo, em Romanos 3, estabelece o raciocínio jurídico da justificação pela fé a partir da imputação, não como poesia solta, mas como argumento dedutivo. Da mesma forma, Hebreus constrói toda sua epístola em cima da lógica interna da aliança, mostrando que se há um sacerdócio superior, o anterior é necessariamente abolido. O autor raciocina porque Cristo é o Logos, e seria impossível falar dele sem recorrer à lógica.

Na língua grega, λόγος também carrega a ideia de proporção, de medida racional. Quando aplicado a Cristo, isso significa que todo o cosmos é sustentado e ordenado por uma racionalidade pessoal. Paulo declara em Colossenses 1:17: “Nele subsistem todas as coisas”. A palavra “subsistir” aqui aponta para a coesão contínua do universo pela lógica divina. Jonathan Edwards chamaria isso de “criação contínua”: nada existe sem o ato lógico e constante de Deus sustentando-o. Rejeitar a lógica é rejeitar a ordem ontológica que mantém a realidade.

Portanto, quando os filósofos contemporâneos zombam da lógica e celebram o irracionalismo, nada mais fazem do que expressar seu ódio a Cristo. Se o Logos é o fundamento de todo pensamento e existência, então negar a lógica é uma forma de ateísmo prático. Cornelius Van Til dizia que os incrédulos, ao usarem lógica para negar a Deus, são como crianças que dão tapas no pai sentado em seus joelhos — só conseguem fazê-lo porque Ele os sustenta. A ironia é que até a negação da lógica pressupõe a lógica. O homem que diz que não há verdade enuncia uma proposição que pretende ser verdadeira; o que diz que não há lógica usa lógica para formular sua negação. Eles são, por natureza, incoerentes, porque rejeitam o Logos, mas ainda assim dependem dele para falar.

A Escritura, por outro lado, apresenta um Cristo que não é apenas Salvador, mas também a estrutura racional que torna o universo inteligível. Nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento (Colossenses 2:3). Essa afirmação não é apenas soteriológica, mas epistemológica e ontológica. Todo conhecimento verdadeiro é conhecimento de Cristo, e toda racionalidade verdadeira é expressão de sua mente. Não existe neutralidade: ou se pensa em Cristo, ou se pensa contra Cristo. O Logos é o critério absoluto que torna impossível a autonomia da razão humana.


sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Ocasionalismo Reformado: Entre a Ambiguidade de Westminster e a Honestidade de Cheung



Este artigo é totalmente gratuito, assim como muitos dos meus livros. Se você deseja contribuir para que eu continue produzindo conteúdo de qualidade, pode fazer uma doação voluntária via Pix para a chave 51996589876 (Nubank). Sua ajuda é fundamental para manter meus projetos ativos!

Por Yuri Schein 

O debate começa daquele jeito típico: alguém invoca a Confissão de Westminster como se ela fosse o Santo Graal da metafísica reformada, imune a escrutínio, clara como água cristalina. Aí aparece o "guardião da ortodoxia" e solta:

Oponente:

“Yuri, mano, acho que você erra o alvo nessa análise. Gordon Clark nunca foi ‘ocasionalista puro’. O que ele fez foi só notar semelhança de linguagem. Westminster fala em causas secundárias, Malebranche fala em ocasiões. Confundir isso com adoção do sistema malebranchiano é distorcer Clark. Além disso, Malebranche anulava agência, Clark não. Westminster preserva agência real. Cheung, sim, vai longe demais, nega agência, e aí dissolve a responsabilidade. Colocar Clark e Cheung no mesmo balaio é forçar. Westminster resolve o problema: Deus decreta tudo, mas criaturas agem de verdade e por isso são responsáveis.”

Traduzindo: Westminster é perfeita, Malebranche é o bicho-papão católico, Clark só flertou com a linguagem, e Cheung é um herege perigoso. Nada de novo sob o sol. O mesmo discurso reciclado de quem acha que repetir o mantra “causas secundárias” resolve dilemas filosóficos e exegéticos.

Minha resposta (ou melhor, a resposta que Westminster teme):

Primeiro ponto: acusar Malebranche de negar agência das criaturas é calúnia de manual. Ele nunca disse que as criaturas não agem; o que ele disse é que elas não são causas eficazes. Ou seja, elas agem como instrumentos ocasionais, mas não possuem nenhum poder ontológico de causalidade. Isso é exatamente o que qualquer teólogo reformado sério deveria dizer, se tivesse coragem de largar Aristóteles por cinco minutos.

Segundo ponto: Westminster “anos-luz” à frente de Malebranche? Piada pronta. Westminster sequer define o que são causas secundárias. Usa o termo, joga no ar, e deixa para cada um encher o balão com a metafísica que quiser: aristotélica, tomista, cartesiana ou, quem sabe, até ocasionalista. Malebranche, por outro lado, pelo menos teve a decência de fazer o trabalho sujo e sistematizar. Westminster foi uma síntese pastoral e confessional, não uma ontologia. O vácuo que ela deixa é o que gera esse debate.

Terceiro ponto: dizer que Clark “não abraçou o sistema de Malebranche” é, no mínimo, tratar Clark como um desavisado de suas próprias palavras. Como se ele tivesse tropeçado em linguagem ocasionalista e dito: “ops, foi sem querer”. Clark não era um amador confuso; era um filósofo preciso. Se ele usou linguagem ocasionalista, é porque entendeu a correspondência. Recusar isso é rebaixar o nível intelectual do próprio Clark, o que eu não estou disposto a fazer.

Quarto ponto: Vincent Cheung. Ah, esse sempre leva pedrada. Acusam-no de negar agência das criaturas, quando o que ele nega é a causalidade ontológica delas. O que é diferente. Para Cheung, Deus é a única causa metafísica real. As criaturas agem, sim, mas não como concorrentes ontológicos de Deus. Elas agem em um plano derivado, sustentado, decretado e controlado. É justamente isso que elimina qualquer dualismo de poderes. E quanto à responsabilidade humana? Ele responde de maneira bíblica e direta: Romanos 9. Deus faz o que quer com o barro. Se você acha injusto, reclame com Paulo.

Mais: Cheung não cai na armadilha de confundir “causar” com “praticar”. A Escritura é clara: Deus causa engano (Ez 14.9), endurece corações (Is 63.17), entrega homens a paixões vis (Rm 1.24-28), coloca intenções malignas nas mentes (Ap 17.17), e ainda assim o homem é responsabilizado porque age segundo a sua própria natureza (Rm 11.32). Quem inventa distinções estranhas entre “causa” e “permissão” é Aristóteles, não a Bíblia.

Westminster, nesse ponto, deixa margem para leituras frouxas, e a teologia reformada clássica muitas vezes importou epistemologia empirista e metafísica aristotélica para preencher o vazio. Cheung simplesmente não engole isso e prefere ser fiel à Escritura em toda a sua força.

Concluindo:

O problema não é Clark, nem Cheung, nem Malebranche. O problema é a covardia intelectual de quem repete Westminster como se fosse um manual de física quântica, mas nunca teve coragem de enfrentar as ambiguidades que ela mesma deixa.

Cheung é honesto. Clark foi mais ocasionalista do que seus fãs querem admitir. Malebranche foi mais bíblico do que a caricatura feita dele. Westminster, no fim das contas, é ambígua — e a ambiguidade sempre será o esconderijo dos que querem salvar as aparências.

Em resumo: a teologia reformada tem duas opções. Ou admite que o ocasionalismo é a lógica necessária da soberania absoluta de Deus, ou continua fingindo que “causas secundárias” resolvem tudo, quando na prática não passam de um espantalho aristotélico.


Deus não apenas permite, ele causa


Por Yuri Schein 

Comecemos com a verdade que faz arminiano espumar e molinista correr para debaixo da cama:

“Logo, tem ele misericórdia de quem quer, e também endurece a quem lhe apraz.” (Romanos 9.18)

Pronto. Não é talvez, não é possivelmente, não é apenas permite. É “endurece a quem quer”. Paulo, coitado, se vivesse hoje, seria cancelado pelos teólogos do livre-arbítrio. A hermenêutica dos “permite” não consegue escapar do simples fato: Deus é o causador. Ele não é um velhinho passivo que deixa os homens brincarem de autodeterminação. Ele endurece. Ele tem misericórdia. Ele faz.

Mas como todo bom rebelde contra a Escritura odeia Romanos 9, vamos dar mais textos para que a consciência deles não tenha paz:

“O nosso Deus está nos céus; faz tudo o que lhe agrada.” (Salmo 115.3)

Olha que terrível. “Faz”. Não é “espera que façam”. Não é “permite que façam”. É “faz”.

“Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida, assim também não sabes as obras de Deus, que faz todas as coisas.” (Eclesiastes 11.5)

Todas as coisas. A linguagem bíblica não tem dó do livre-arbítrio. Se o ímpio tropeça na calçada, foi Deus quem causou. Se um bebê nasce, foi Deus quem causou. Se uma bomba explode, foi Deus quem causou. Sim, você leu certo: foi Deus.

“Nele, digo, no qual fomos também feitos herança, havendo sido predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade.” (Efésios 1.11)

É como se Paulo tivesse prazer em esmagar a filosofia dos que tentam livrar Deus da soberania. “Todas as coisas segundo o conselho da sua vontade”. O pecado? Todas as coisas. A queda de reis? Todas as coisas. Os pensamentos do coração humano? Todas as coisas.

Agora, a parte divertida: o mito da “permissão”.

Teólogos sem coragem para confessar a soberania de Deus dizem que “Deus permite o mal”. O problema? A Bíblia nunca usa “permissão” em sentido metafísico. Permissão em linguagem bíblica é apenas uma categoria imanente, ou seja, descritiva do modo como as coisas aparecem para nós, não da realidade última da causalidade.

Exemplo: quando José é vendido pelos irmãos, ele mesmo diz: “Vós intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem” (Gn 50.20). Ele não disse: “Deus apenas permitiu e torceu para dar certo”. Ele disse: “Deus o tornou”. Deus estava por trás, como o causador.

Quando o Senhor entrega reis nas mãos de seus inimigos (Js 11.20), não é que Ele só “permitiu” com lágrimas nos olhos. O texto é claro: “porque do Senhor veio o endurecimento do seu coração”. Não existe “plano B”. Não existe “permissão metafísica”. Existe causalidade soberana.

Permissão só existe na dimensão de como os homens percebem. “Deus permitiu que eu pecasse” não significa que Deus se afastou e ficou neutro. Significa apenas que, aos meus olhos, eu me senti livre, mas, na realidade, Deus decretou, causou e sustentou cada detalhe daquele pecado – sem, contudo, pecar.

O Deus bíblico não é o gerente que assina autorizações para ver se o universo anda. Ele é o autor do roteiro, o diretor da peça e o ator principal. Nós? Marionetes conscientes, escravos de nossa própria vontade, mas sempre presos ao fio invisível da soberania absoluta.

Então, da próxima vez que alguém falar que “Deus apenas permite”, sorria com sarcasmo e responda:

— Amigo, o Deus que só permite não é o Deus da Bíblia. Esse é o ídolo que você criou para salvar o livre-arbítrio, mas não salva ninguém.

Porque o Deus verdadeiro não apenas permite.

Ele causa.