Por Yuri Schein
Há duas maneiras de se aproximar de João 2: com a Bíblia aberta ou com os joelhos tremendo diante de uma garrafa de vinho. Infelizmente, muitos preferem a segunda. Suas sensibilidades temperantes exigem que Cristo nunca tenha tocado álcool, como se o Filho de Deus precisasse obedecer à cartilha dos adventistas modernos para ser santo.
Mas exegese não é terapia psicológica anti-álcool. Ou deixamos o texto falar, ou o mutilamos. E quando o assunto é o vinho de Caná, o texto grita: era alcoólico sim.
A seguir, destruo, com polpa, casca e engaço, cada tentativa de transformar Jesus em fabricante de suquinho gospel.
📍Texto acima de sensações: a cena real
Em Caná, temos:
um mestre-sala julgando vinho por qualidade e efeito
convidados que já estavam alegres (Jo 2:10)
o milagre sendo chamado de manifestação de glória (Jo 2:11)
Ou seja: isso não é Yakult no casamento.
É vinho de verdade, bebido por gente real, celebrando com alegria real.
O termo oinos pode, em teoria, abranger suco não fermentado, assim como “carne” pode incluir mortadela vegetal. Mas palavras têm sentido determinado pelo contexto, e o contexto aqui é:
“Quando JÁ ESTÃO EMBRIAGADOS…”
— João 2:10
O verbo μεθυσθῶσιν significa justamente isso: embebedar-se.
Só há embriaguez onde há álcool.
Fatos são teimosos
📍Vinho bom não é suco sem álcool
O mestre-sala se surpreende, porque:
O MELHOR ficou para o fim (Jo 2:10)
Em festas antigas, o melhor vinho era o que fazia efeito, não o que parecia Gatorade de uva. A lógica social da época era:
primeiro o vinho que anima
depois o vinho mais fraco, quando os sentidos já estão amortecidos
Jesus inverteu:
primeiro o vinho comum
depois o vinho superior, que continua a alegria
Só faz sentido se for alcoólico.
Senão, a frase seria:
“Uau, guardaram o Del Valle de uva puro! Sem corante! Que audácia!”
Um insulto ao texto.
📍Purificação não proíbe celebração: Cristo supera o ritual
As talhas eram de purificação? Sim.
E daí?
Cristo toca em impuros, cura em sábado, derruba cambistas do templo — Ele não é escravo do ritual, Ele é o substituto do ritual.
O vinho não vem de purificação.
Vem em lugar da purificação.
O que antes purificava externamente agora se torna alegria interna.
Isso é teologia, não medo de rolha.
📍Quantos litros mesmo? Chora, moderado
O argumento:
“Jesus fez muito vinho, logo isso estimularia bebedeira!”
Ah, então:
multiplicar pães estimula glutonaria?
dar salário estimula roubo?
dar esposa estimula adultério?
Não.
O pecado está no pecador, não no dom de Deus.
Além disso, a festa durava vários dias. A matemática do pânico não convence.
📍O Pai dá vinho e é bênção
Antes de atribuir imoralidade ao milagre, leia:
O vinho alegra o coração humano (Sl 104:15)
Dai bebida ao aflito (Pv 31:6)
Paulo manda Timóteo usar vinho (1Tm 5:23)
Se dar vinho é pecado, Deus pecou.
Se alegrar com vinho é tropeço, o salmista tropeça.
Se bebida alcoólica é moralmente errada, a Escritura precisa ser corrigida e não Jesus.
📍“Jesus recusou vinho na cruz” – sofisma tosco
Ele recusou narcótico, não bebida festiva.
Confundir Gólgota com casamento é insanidade exegética.
Na cruz Ele rejeita anestesia para sentir toda a dor do juízo.
No casamento Ele oferece alegria para antecipar a festa messiânica.
Momentos diferentes, propósitos diferentes, substâncias diferentes.
📍O que realmente incomoda o abstêmio?
Jesus foi acusado de:
“glutão e BEBEDOR de vinho” (Lc 7:34)
Veja: chamaram João Batista de endemoninhado por não beber, chamaram Jesus de bebedor por beber
Jesus não se defendeu dizendo que era suco.
Ele simplesmente afirmou:
“A sabedoria é justificada por suas obras”
A verdade é dura:
Jesus bebia álcool.
Com frequência suficiente para caluniadores criarem fama.
Se isso escandaliza alguém, o problema é do fariseu, não do Messias.
✅ O verdadeiro escândalo: negar alegria à graça
O primeiro sinal fala de:
alegria
aliança
plenitude
a substituição da água fria do ritual pelo calor do Espírito
Transformar isso em suco pasteurizado é violência ao texto e à teologia.
Jesus não inaugurou Seu ministério com: 📍abstinência
📍neurose alimentar
📍ética da moderação estéril
Mas com: 🍷 festa
🍷 alegria
🍷 abundância
“Enchei até o alto” (Jo 2:7) e quem não aguenta, beba menos.
Cristo não trocou a água em suco.
Ele trocou o legalismo em graça.
🍇 Negar o álcool em Caná é negar:
o contexto histórico
o grego do texto
o simbolismo do sinal
o caráter celebrativo da fé bíblica
É impor ao Cristo uma moralidade fraca, que não nasce das Escrituras, mas do medo. A Bíblia não apresenta um Jesus que protege seres humanos do vinho. Apresenta um Jesus que protege o vinho dos moralistas.
Eis a glória do primeiro sinal:
onde havia purificação ritual, agora há alegria messiânica. E quem quiser arrancar o álcool disso terá que espremer a Bíblia até sangrar.

