O vale amaldiçoado finalmente começava a ceder diante do grupo, o frio penetrante diminuindo apenas um pouco, mas o silêncio e a opressão continuavam inalterados. As árvores mortas se estreitavam em uma clareira mais ampla, ainda marcada por ossos e restos de criaturas fantásticas. A luz prateada da lua crescente refletia em cada superfície, lançando sombras longas e distorcidas que pareciam se mover com vida própria.
Foi então que Derek, atento a cada detalhe, parou abruptamente, sinalizando para os outros com um gesto da mão. Entre um amontoado de ossos e troncos quebrados, um corpo esquelético se destacava. Estava ajoelhado, a cabeça tombada para frente, com os punhos cerrados e imóveis. Mas entre os dedos ossudos, algo capturava a luz da lua e a multiplicava em reflexos dourados e vermelhos que dançavam como chamas suspensas. Brilhava com intensidade quase hipnótica.
“São… brincos?” murmurou Raella, a voz trêmula, enquanto Gillian se aproximava, tentando olhar sem se expor a qualquer maldição que pudesse estar ligada ao objeto. “Isso… isso deve ser os brincos da lenda de Valeth… a maldição…”
Thomas suspirou, a expressão sombria. “A história é exatamente esta. Alguém… alguém conseguiu chegar até este ponto. Conseguiram tocar o tesouro, mas a maldição os alcançou. O corpo que vemos não é apenas uma vítima — é um aviso. A cobiça que levou o aventureiro até aqui transformou-o em ossos e sombra, preso à matéria para sempre. Esses brincos… não devem ser tocados. Nada aqui deve ser tocado.”
Ikarus aproximou-se, a mão levemente na empunhadura da espada, observando os punhos cerrados e o brilho reluzente. “Então… isso é real. Eles não eram apenas contos para assustar viajantes. Este… é o perigo que Thomas mencionou. Este é o preço da cobiça.”
Gillian, olhando com os olhos semicerrados, murmurou: “Não devemos tocar. Nem pensar em pegá-los. Se fizerem isso, podemos acabar como ele.”
Raella segurou o braço de Gillian, a voz trêmula mas firme: “O que mais sabemos sobre a maldição? É apenas uma prisão física ou… é a alma que se perde também?”
Thomas deu um passo atrás, olhando para o esqueleto com pesar. “A lenda diz que a deusa Valeth não apenas pune o corpo, mas também a alma. Qualquer toque que desperte o desejo de posse desperta a maldição. Aquele que se deixa seduzir pelos brilhos e pelo ouro está fadado a repetir os erros do aventureiro que veio antes. Ele conseguiu chegar até aqui… mas não conseguiu sair.”
Jetto permaneceu um passo à frente, farejando o ar e observando os brincos. Seus olhos refletiam a luz que emanava deles, e mesmo que sua mente consciente estivesse alerta, o coração e os instintos falavam outra língua. O brilho dourado e vermelho era quase magnético, e o desejo antigo, reprimido durante anos de disciplina e convivência com a Dríade, começou a despertar. Ele sabia que, se qualquer ser do mundo tivesse conhecimento de um artefato assim, ele saberia. Mas algo dentro dele dizia que, talvez, apenas talvez, a exceção tivesse sido feita… e ele poderia reivindicar a relíquia.
Derek franziu o cenho, observando Jetto com cautela. “Não toque nisso. Não é apenas um objeto, Jetto. É… é a própria maldição em forma de metal e ouro. Você já sabe o que a história diz — não podemos tocar, não devemos tocar, nunca!”
Ikarus aproximou-se, colocando a mão sobre o ombro de Jetto. “Ele está certo. Pense nas consequências. Você sabe o que aconteceu com todos antes de nós. É um aviso, Jetto. A maldição não é simbólica. Ela é real. Não toque.”
Mas Jetto não se moveu para trás. O faro de lobisomem, o instinto e a razão humana colidiam com intensidade. O brilho parecia penetrar na própria alma dele, cada reflexo dançando como se chamasse pelo seu nome, oferecendo poder, riqueza e glória impossíveis de recusar. A luz parecia pulsar com um ritmo próprio, ressoando com a batida acelerada do seu coração.
“Se…” murmurou ele, quase para si mesmo, a voz carregada de desejo contido, “se apenas… apenas um toque… eu poderia… entender o poder…”
Gillian deu um passo à frente, inquieta. “Jetto! Não! Você está brincando com algo que nem mesmo nós podemos compreender. Pense no que Thomas disse — qualquer toque e você ficará preso como ele. Preso!”
Mas a mão de Jetto, trêmula, começou a se aproximar dos punhos cerrados do esqueleto. O ar parecia condensar-se, pesado, carregado de energia antiga e maliciosa. Cada passo que ele dava em direção aos brincos fazia com que o frio da maldição se tornasse quase tangível, envolvendo o grupo, penetrando nos ossos, sugando a coragem como se a própria esperança fosse filtrada da realidade.
Ele parou diante do esqueleto, e por um instante, a lua crescente refletiu diretamente nos brincos, fazendo-os brilhar com intensidade sobrenatural. O som do vento, que antes apenas uivava entre os troncos mortos, agora parecia sussurrar em línguas antigas, promessas e advertências entrelaçadas. O brilho, a promessa de poder, a beleza quase hipnótica… era irresistível.
Então, silenciosamente, Jetto estendeu a mão. Um dedo, depois outro, os ossos do esqueleto pareciam vibrar, mas nenhum movimento vivo se opôs. Seus dedos tocaram a superfície fria e polida dos brincos, e a luz refletida pareceu crescer, pulsar, como se a própria caverna estivesse respirando ao redor deles, consciente do ato.
“Jetto… não…” a voz de Ikarus, firme mas carregada de urgência, foi engolida pelo peso do momento, e o grupo inteiro se encolheu, percebendo que naquele instante algo muito maior do que todos eles estava em jogo.
E ali, entre os ossos, as árvores secas, o silêncio mortal e a luz da lua crescente, Jetto segurava os brincos — e o ar ao redor parecia carregar a tensão de séculos de maldição, a promessa de um poder inestimável, e a certeza de que nenhum passo daqui em diante seria igual ao que veio antes.
Um frio percorreu o vale, os ecos do passado ressoando em cada osso, cada tronco seco, cada sombra que os observava silenciosa. E então, no momento em que os dedos de Jetto fecharam-se completamente sobre os brincos… o silêncio foi quebrado por um sussurro distante, etéreo, que parecia atravessar o tempo e o espaço:
“Você escolheu… e agora o preço será seu.”
O grupo parou, imóvel, enquanto a luz prateada da lua refletia nos brincos, agora na mão de Jetto, brilhando mais intensamente do que antes, como se a própria maldição tivesse despertado.
O suspense pairava no ar, espesso, quase tangível. O futuro, tão incerto quanto os ossos e sombras à sua volta, aguardava para se revelar.

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