Uma autópsia teológica da teimosa ilusão do livre-arbítrio
Por Yuri Schein
“O tolo crê em tudo que ouve, mas o prudente atenta para os seus passos.”
— Provérbios 14:15
Eu realmente preferia que outro se desse ao trabalho de realizar essa dissecação. Mas, como muitos em nossos dias parecem mais preocupados em preservar a aparência de humildade do que em esmagar a cabeça das serpentes doutrinárias, tomo para mim o encargo. Sim, é um encargo. Refutar heresias nunca é agradável, mas é absolutamente necessário. E entre as heresias evangélicas de estimação, poucas são tão populares quanto a “graça preveniente”. Esse unicórnio soteriológico que cavalga os campos do emocionalismo, das tradições humanas e das alegorias mal interpretadas.
A proposta deste texto é simples: desmascarar o conceito da graça preveniente, demonstrar sua completa ausência nas Escrituras, e ainda expor como muitos dos versículos usados pelos arminianos acabam funcionando como sentença de morte à própria teologia deles — o que é quase uma ironia divina.
O Que é a "Graça Preveniente"? Um Mito Disfarçado de Misericórdia
Graça preveniente, segundo a definição arminiana (ou semi-pelagiana, sejamos francos), é aquela “graça universal” concedida por Deus a todos os homens indistintamente, para que eles possam, de maneira livre e autônoma, decidir se crerão ou não no evangelho. Em outras palavras: Deus dá uma ajuda inicial, uma espécie de empurrãozinho, mas a decisão final fica a cargo do homem. Soa bonito, parece democrático, mas é absolutamente antibíblico.
De início, é curioso notar que os próprios defensores dessa doutrina admitem que não há uma passagem clara e direta que ensine isso. Isso mesmo, eles começam seu argumento com um pedido de desculpas embutido:
"A Escritura ensina o conceito de graça preveniente?
Não há uma passagem que estabelece uma definição sistemática, no entanto, o conceito torna-se evidente por todo o teor geral da escritura."
Isso é tão convincente quanto dizer que a Bíblia ensina reencarnação “em espírito” porque há muitas “metáforas sobre nascer de novo”. Quando você precisa recorrer ao “teor geral” para justificar uma doutrina que supostamente sustenta a salvação universalista-condicional do homem, talvez seja hora de voltar para o catecismo. De Genebra, de preferência.
A Premissa Arminiana: Uma Revolta Contra a Soberania de Deus
A graça preveniente é, em última análise, uma tentativa tola de salvar o ídolo favorito da filosofia humanista: o livre-arbítrio. O Arminianismo, por mais que tente parecer uma versão bíblica do cristianismo, nasce de um pressuposto antibíblico: de que a vontade do homem é o fator decisivo na salvação.
Ora, se isso é verdade, então:
O decreto eterno de Deus é secundário.
A eleição incondicional é injusta.
A cruz de Cristo foi uma aposta.
O Espírito Santo apenas “sugere”.
E a regeneração não passa de um convite que o homem pode recusar com educação.
Compare isso com Romanos 9, onde Paulo, sob inspiração do Espírito, antecipa a objeção arminiana:
"Por que se queixa ele ainda? Pois quem tem resistido à sua vontade?" (Rm 9:19)
E ao invés de dar uma explicação arminiana, Paulo dá uma resposta teocêntrica e firme:
"Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?" (Rm 9:20)
Ou seja, Paulo não conhecia graça preveniente. Ele conhecia graça soberana, que escolhe, determina, chama e salva — sem a permissão do homem.
A Inutilidade do Argumento Arminiano: "Está Implícito!"
Vamos ser claros: dizer que algo está “implícito” na Bíblia não é um álibi válido para inventar doutrinas. A Trindade, por exemplo, está implícita — mas em harmonia com todo o restante da revelação e explicitada nas confissões históricas. Já a graça preveniente não tem nem isso. Não é doutrina implícita; é imposição filosófica.
O que o arminiano faz é tentar enxertar ideias de liberdade libertária, autonomia humana e bondade natural em textos que, francamente, falam do oposto. Ele lê João 6:44 (“Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o trouxer”) como se dissesse “ninguém vem a mim a não ser que o Pai ajude a puxar”. Ele quer que “trazer” signifique “convidar gentilmente”, quando o termo grego helkō significa arrastar com força — o mesmo usado para a rede cheia de peixes em João 21:11. Ou seja, Deus arrasta os eleitos até Cristo, não os “convida para um café”.
A Corrupção Total do Homem: O Elefante que o Arminiano Finge Não Ver
A doutrina bíblica da depravação total — sim, a que Lutero defendeu com garras e dentes contra Erasmo — ensina que o homem não apenas está doente, mas morto espiritualmente (Ef 2:1). Morto, não desidratado. Morto, não em coma. Morto, como em “sem capacidade de reagir”.
Portanto, dizer que o homem precisa de uma graça que o “coloque numa posição de decisão” é o mesmo que dar um microfone a um cadáver e esperar uma resposta racional.
Veja a descrição de Paulo:
"Não há ninguém que entenda, ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram...” (Rm 3:11-12)
Se ninguém busca a Deus, quem são os tais que respondem à graça preveniente? Extraídos de onde? De que planeta? Nem mesmo Pelágio foi tão otimista com a natureza humana.
A Doutrina Reformada: Graça Irresistível e Regeneração Monergística
A resposta bíblica e coerente é a doutrina da graça irresistível. Deus salva pecadores por meio de um ato soberano, eficaz e infalível de sua vontade, através do chamado interno do Espírito Santo. Essa regeneração precede qualquer resposta humana — e é ela que torna possível a fé.
“Todos os que haviam sido destinados para a vida eterna creram.” (At 13:48)
“Ele nos gerou segundo a sua vontade, pela palavra da verdade.” (Tg 1:18)
Não há “pré-condição” humana. Não há “decisão autônoma”. O novo nascimento é uma criação divina unilateral, um ato do mesmo Deus que disse: “Haja luz” — e houve. (2 Co 4:6)
O Cavalo de Tróia Arminiano
A graça preveniente é o cavalo de Tróia pelo qual o livre-arbítrio tenta invadir os muros da soberania divina. Mas, como todo cavalo de Tróia, é feito de madeira barata e recheado de inimigos. O problema? Muitos púlpitos deixam ele entrar, sem nem perguntar o que diz a Confissão de Fé de Westminster, ou os escritos de Calvino, ou o bom e velho capítulo 9 de Romanos.
Mas nós não.
Nós respondemos com fogo.
Fogo exegético. Fogo lógico. Fogo bíblico.
Pois a verdade é essa: se a graça preveniente existisse, ninguém seria salvo, porque o homem rejeitaria até a misericórdia, se pudesse. O evangelho não é uma proposta — é uma proclamação soberana. Não é uma escolha — é uma intervenção divina. E não é uma chance — é uma certeza para os eleitos.
Prepare-se, então, arminiano. Nos próximos artigos, vamos examinar cada texto que você tenta usar para defender essa doutrina. E, com a graça irresistível de Deus, vamos mostrar que o arminianismo não precisa de refutação — ele se autodestrói com suas próprias citações.
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