2.3. O “Motor” que Não Move
O “Primeiro Motor” aristotélico é impassível, imóvel, sem contato direto com o mundo. Ele atrai tudo como objeto final de desejo, mas não age. Isso é uma contradição: se é causa eficiente, então atua; se é imóvel, não pode causar. Aristóteles tenta evitar esse problema transformando a causalidade em atratividade final — mas então, o Primeiro Motor não é causa eficiente, e sim causa final. E nada muda dizendo que Deus é “Ato puro” pois um ato eterno é uma eterna movimentação.
Vamos considerar o seguinte silogismo
Premissa 1: O Primeiro Motor é causa eficiente do movimento universal.
Premissa 2: O Primeiro Motor é completamente imóvel e sem ação direta.
Conclusão: Logo, o Primeiro Motor é e não é uma causa eficiente — uma contradição.
Greg Bahnsen comenta:
“A cosmovisão não cristã oscila entre causalidade determinista e espontaneidade irracional. Aristóteles tenta escapar disso com categorias misturadas, mas termina autocontraditório” (Van Til’s Apologetic, p. 151).
Parte IV: O Colapso do “Ato Puro” – A Contradição Metafísica do Motor Imóvel
Aristóteles, ao tentar evitar os absurdos da mudança infinita e a regressão causal, postula o conceito de um “Ato Puro” (actus purus): um ser plenamente realizado, sem potencialidade alguma, imóvel, perfeito, eterno, necessário e, paradoxalmente, a causa de todo o movimento. Mas essa tentativa de salvar seu sistema apenas agrava sua ruína filosófica. O “Ato Puro” é, em última análise, uma contradição metafísica refinada — um ídolo filosófico elevado ao status de divindade.
4.1. Ato Puro: Um Oxímoro Ontológico
O conceito de “Ato Puro” deriva do dualismo entre ato e potência que permeia a filosofia de Aristóteles. Algo é considerado em ato quando realiza plenamente sua forma, e em potência quando tem a capacidade de realizar algo. Aristóteles afirma que o Primeiro Motor é ato sem potência — ele não muda, não pode mudar, e não é afetado por nada. É eternamente o que é.
Porém, se esse ser é também a causa do movimento, temos um problema, eis o silogismo:
Premissa 1: Todo agente causal eficiente age.
Premissa 2: Todo ato implica atualização de potência.
Premissa 3: O Ato Puro não tem potencialidade, logo não pode realizar nenhum ato.
Conclusão: O Ato Puro não pode agir — portanto, não pode causar nada.
O conceito implode por dentro. É como um fogo que queima sem calor, uma mente que pensa sem consciência, ou um motor que move sem energia.
Vincent Cheung afirma de modo incisivo:
“Se o deus dos filósofos não age, ele é um ídolo morto. Se age, então tem potencia, então não é Ato Puro. A solução? Rejeitar o ídolo.” (Systematic Theology, p. 92).
Um Ato Eterno é uma Eterna Movimentação
Mesmo que o aristotélico tente fugir pela tangente dizendo que esse “Ato Puro” não muda ao mover os outros, mas apenas atrai como fim desejado (causa final), ele incorre em outro dilema fatal: atrair eternamente é um tipo de atividade. Uma atividade eterna é uma ação sem começo nem fim, ou seja, um movimento eterno.
Greg Bahnsen diz:
“A cosmovisão pagã, ao tentar preservar a imutabilidade, destrói a causalidade; ao tentar preservar a causalidade, destrói a imutabilidade.” (Van Til’s Apologetic, p. 183)
O próprio Aristóteles afirma no Livro XII da Metafísica que o motor imóvel move como objeto de amor e desejo. Mas amor, desejo e finalidade pressupõem relação. Relação é uma estrutura ontológica entre entes distintos, o que contradiz a ideia de independência total do Primeiro Motor.
Logo:
Silogismo da Contradição do Ato Puro:
Premissa 1: Se o Ato Puro causa movimento eterno, então ele age eternamente.
Premissa 2: Agir eternamente é estar em movimento eterno.
Premissa 3: O Ato Puro é imóvel.
Conclusão: O Ato Puro é móvel e imóvel ao mesmo tempo — contradição.
Dooyeweerd e a Crítica à Substancialização da Forma
Herman Dooyeweerd é ainda mais incisivo ao mostrar que o conceito de substância como forma pura (que embasa o Ato Puro) é uma absolutização ilegítima de um aspecto da criação:
“Toda absolutização de um aspecto modal da realidade, como a forma ou a substância, termina num dualismo insolúvel e numa divinização da criatura.” (In the Twilight of Western Thought, p. 19)
Assim, Aristóteles idolatra o “ser em ato”, transformando uma abstração lógica em um ídolo ontológico. Ele comete o pecado epistemológico de Romanos 1:25 — adora a criatura (no caso, o conceito de ato) em lugar do Criador.
O Deus de Aristóteles Não é o Deus da Bíblia
O Deus de Aristóteles:
É impessoal,
Não conhece o mundo (conhece apenas a si mesmo),
Não é Criador (o mundo é eterno),
Não exerce providência,
Não decreta,
Não fala,
Não age na história,
Não tem relação com a criação.
Já o Deus da Escritura:
É pessoal (Êxodo 3:14),
É Criador ex nihilo (Gênesis 1:1),
Governa todas as coisas (Efésios 1:11),
Conhece e determina cada detalhe do universo (Salmo 139; Provérbios 16:33),
Sustenta o mundo continuamente (Hebreus 1:3),
Fala com os homens (Hebreus 1:1),
Age providencialmente em todas as coisas (Romanos 8:28).
Gordon Clark afirma de forma categórica:
“O Deus da Bíblia é um Deus de lógica, proposição, revelação e decreto. O deus dos filósofos é mudo e inútil. Ele não fala, não ouve, não cria, e não salva.” (The Trinity, p. 105)
Parte V: Encerramento – O Templo Pagão em Ruínas
A tentativa aristotélica de substituir a revelação pela razão leva à desintegração metafísica e lógica. A doutrina das quatro causas, o Primeiro Motor, o Ato Puro — todos são fragmentos de uma idolatria refinada, sustentada por induções falhas, abstrações autocontraditórias e epistemologia pagã.
A cosmovisão cristã reformada — baseada na revelação proposicional de um Deus triúno, pessoal, criador e soberano — é a única estrutura que faz o conhecimento possível.
Cornelius Van Til resume com precisão:
“O Deus cristão não é apenas necessário para a teologia — Ele é a condição necessária para todo conhecimento. Negá-lo é abraçar o absurdo.” (The Defense of the Faith, p. 102)
Aristóteles tentou construir um templo racional onde a criatura se assenta como criador — mas a Palavra de Deus demole cada pedra. E nós, como apologetas do Rei dos reis, proclamamos sem rodeios: “Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século? Porventura não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo?” (1 Coríntios 1:20).
Soli Deo Gloria.
Parte III: A Supremacia da Revelação e a Impossibilidade do Conhecimento Fora de Deus
3.1. Conhecimento sem Revelação Leva à Ignorância Sistemática
Herman Dooyeweerd afirma:
“Toda tentativa de conhecimento baseada na razão autônoma absolutiza aspectos da criação e termina em idolatria” (A New Critique of Theoretical Thought, Vol. I, p. 35).
A filosofia de Aristóteles absolutiza o movimento, a substância e a forma — aspectos da realidade criada — como fundamentos últimos. Isso é idolatria ontológica.
3.2. Somente Deus é a Causa Primeira, Eficiente e Final
O Deus da Bíblia é o Criador pessoal, que não apenas causa o universo, mas o sustenta continuamente (Colossenses 1:17; Hebreus 1:3). Ele é causa eficiente (Salmo 33:9), causa formal (Efésios 1:11), causa material (Gênesis 2:7) e causa final (Romanos 11:36). Em Deus, e somente em Deus, as quatro causas se encontram de forma absoluta e revelada.
3.3. Conclusão Final: A Queda de Aristóteles
O sistema causal de Aristóteles e seu argumento do Primeiro Motor Imóvel são ruínas filosóficas. São frágeis, incoerentes, baseados na indução, contraditórios e epistemologicamente inválidos. Sua falência não é apenas intelectual, mas moral e espiritual (Romanos 1:18-23). Ao tentar substituir a revelação de Deus pela razão humana, Aristóteles se tornou o pai da idolatria metafísica no Ocidente.
O PAI DO PRAGMATISMO NO OCIDENTE
Se Platão buscava o mundo das ideias como absoluto metafísico, Aristóteles tentou enraizar o conhecimento no mundo sensível e na práxis, na utilidade, na finalidade, no telos empírico do agente moral. Com isso, Aristóteles estabelece, em sua Ética a Nicômaco, o fundamento de toda ética pragmática e utilitarista moderna — antecipando autores como John Stuart Mill, William James e até o instrumentalismo epistemológico de Dewey e Rorty.
Enquanto ele rejeita o hedonismo direto dos cirenaicos e epicuristas, Aristóteles substitui o prazer físico pela “eudaimonia”, a “felicidade racional”, entendida como o “bem supremo” alcançado pelo exercício virtuoso das faculdades humanas.
1. A Eudaimonia como Círculo Vicioso Ético
Para Aristóteles, o bem é aquilo que realizamos como finalidade de nossas ações — é o fim último. Mas ele nunca define objetivamente por que esse fim é verdadeiramente bom. Ele apenas afirma que a felicidade é desejável por si mesma, portanto é o bem. Isso é um raciocínio circular:
Premissa 1: O bem é aquilo que é desejado por si mesmo.
Premissa 2: A felicidade é desejada por si mesma.
Conclusão: A felicidade é o bem.
Greg Bahnsen diria:
“A cosmovisão não cristã raciocina dentro de um círculo, onde suas premissas carecem de qualquer autoridade normativa. A razão se torna escrava do pragmatismo.” (Always Ready, p. 114)
Isso é pragmatismo em seu nascedouro: o bem é aquilo que funciona para alcançar um fim desejado. A verdade moral é reduzida àquilo que leva à autorealização racional — o mesmo conceito central do utilitarismo secular.
1.2 A Ética das Virtudes é Fundada em Conveniência e Hábito Social
A noção de virtude em Aristóteles é relativa à mediania (mesotês), ao equilíbrio entre extremos, e só pode ser conhecida pela experiência e hábito. Ele diz:
“As virtudes morais são adquiridas pelo hábito; daí o nome ethike, que vem de ethos (costume).” (Ética a Nicômaco, II, 1)
Mas se as virtudes são produto de hábito e convenção, então são essencialmente relativas a uma cultura e tempo. O conceito de justiça, coragem, temperança, etc., passa a ser dependente do costume, da conveniência, da experiência. Isso é puro relativismo ético mascarado de racionalismo.
Herman Dooyeweerd aponta:
“Aristóteles absolutizou o aspecto social-histórico da norma, subordinando a moral ao desenvolvimento da polis e à vida prática. Isso destrói toda normatividade transcendental.” (Roots of Western Culture, p. 74)
Assim, Aristóteles nega toda normatividade objetiva que transcenda a experiência humana. Ele não tem mandamentos — tem conveniências. Não tem Lei — tem hábito. Não tem Deus — tem homem virtuoso como fim último.
2. O Deus do Pragmatismo é o Homem Racional
A idolatria moral de Aristóteles culmina em sua concepção do homem como o ser que realiza sua natureza ao atingir a aretê (excelência racional). Mas se a excelência é definida pela natureza humana e não por uma revelação transcendental, então a ética aristotélica não é uma submissão a Deus — é uma auto-realização do homem.
Ou seja: Aristóteles diviniza o homem racional.
É exatamente isso que o pragmatismo moderno faz: define a verdade como aquilo que funciona para o agente humano. William James, influenciado por Aristóteles, afirmou:
“O verdadeiro é simplesmente aquilo que é vantajoso crer.” (The Meaning of Truth, p. 106)
E John Dewey:
“Não há verdade fixa; há apenas o que satisfaz as necessidades da experiência humana.” (Logic: The Theory of Inquiry, p. 83)
Tudo isso foi gestado na matriz aristotélica da aretê, da eudaimonia, da ética da mediania e do hábito virtuoso. Aristóteles foi o arquiteto metafísico da moralidade secular e funcionalista.
2.2 A Refutação Pressuposicional: A Revelação, não a Prática, é o Fundamento da Moralidade
Como refutamos isso? Com a espada da revelação divina.
Premissa 1: A moralidade objetiva exige um Legislador transcendente e pessoal.
Premissa 2: Aristóteles nega tal Legislador e fundamenta a ética no hábito e na racionalidade humana.
Conclusão: Logo, sua ética é subjetiva, arbitrária e destrutiva.
Cornelius Van Til observa:
“A ética não cristã oscila entre o caos do relativismo e o vazio da abstração. Somente o Deus triúno da Escritura fornece os preceitos morais absolutos que podem governar a ação humana.” (Christian Apologetics, p. 142)
Vincent Cheung reforça:
“A moral não é função da razão prática. Ela é revelada. O que é certo é aquilo que Deus ordena. O que é errado é o que Deus proíbe. Tudo mais é especulação idólatra.” (Presuppositional Confrontations, p. 66)
Conclusão Final: Aristóteles, o Profeta da Idolatria Intelectual
Aristóteles não foi apenas o pai da lógica formal — foi também o pai do paganismo refinado, do racionalismo ético, do empirismo disfarçado de ciência, e da religião humanista da virtude sem revelação.
Ele é o precursor da ética situacional, do relativismo cultural, do pragmatismo psicológico e da idolatria da experiência. Sua metafísica criou o caminho para o deísmo; sua ética, para o humanismo secular; sua epistemologia, para o empirismo agnóstico.
A cosmovisão bíblica, ao contrário, proclama:
“O temor do SENHOR é o princípio do saber; os loucos desprezam a sabedoria e a instrução” (Provérbios 1:7).
A verdadeira virtude não é o meio termo — é obedecer ao Deus que fala. A felicidade não é a realização racional — é a comunhão com o Criador por meio de Cristo. E a moralidade não é produto da prática — é fundada nos preceitos infalíveis da revelação divina.
Aristóteles nos legou um cadáver lógico e uma alma morta. A Escritura, porém, nos dá vida eterna e sabedoria infalível.
Soli Deo Gloria.
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