Tales de Mileto e o Naufrágio da Filosofia Naturalista — Uma Refutação Pressuposicionalista, por Yuri Andrei Schein
Quando Tales de Mileto olhou para a vastidão do cosmos e concluiu que “tudo é água”, não podemos deixar de admirar, com uma risada piedosa e compassiva, a ousadia do homem em querer abarcar a realidade com um balde vazio. Sua tentativa de estabelecer um archê, um princípio absoluto e fundamental do universo, com base na observação empírica e na especulação racional sem revelação, é o testemunho inaugural da tragédia do pensamento autônomo. E não por acaso, a anedota mais famosa a seu respeito nos informa que, enquanto contemplava as estrelas, caiu em um poço — uma parábola literal da condição epistemológica da humanidade sem Deus.
I. A Metafísica do Dilúvio: “Tudo é água”
A proposta de Tales de que a substância fundamental de tudo é água deve ser recebida com a mesma seriedade com que escutamos uma criança dizendo que o universo é feito de chocolate. Para um pressuposicionalista, essa ideia é não apenas errada, mas categoricamente absurda, porque parte de um fundamento epistemológico falido: a razão autônoma. Como observa Gordon Clark, “A razão humana não pode, por si mesma, dar conta do universo. Qualquer sistema baseado na autonomia humana é logicamente incoerente e epistemologicamente impotente” (Clark, A Christian View of Men and Things).
O problema com a afirmação de Tales não está apenas na falibilidade da observação empírica (embora isso já fosse suficiente), mas na pretensão gnóstica de conhecer a natureza última da realidade sem uma Palavra de Deus revelada. A água, enquanto elemento mutável e contingente, não pode fundamentar um cosmos ordenado e inteligível. Somente o Deus triúno das Escrituras, cuja mente é a fonte da lógica e da ordem, pode fornecer as condições para o conhecimento. Ao invés disso, Tales constrói sua metafísica sobre aquilo que é essencialmente fluido, instável, e impotente para sustentar qualquer necessidade lógica.
Vincent Cheung corretamente aponta que “não há conhecimento fora da revelação divina. Todas as outras tentativas são fantasias delirantes que inevitavelmente colapsam sob sua própria incoerência” (Cheung, Ultimate Questions). Se “tudo é água”, então inclusive o próprio Tales — e sua mente, seus pensamentos, sua lógica — são apenas variações líquidas de H2O. Mas como pode um copo de água formular silogismos? Como pode um rio fazer inferência dedutiva? A ideia é tão ridícula quanto filosoficamente suicida.
II. A Água que Afoga a Lógica
Se tudo é água, então não existe uma distinção real entre sujeito e objeto, entre premissas e conclusões, entre proposições e estados mentais. Van Til frequentemente lembrava que “a mente do incrédulo está em guerra contra Deus e, portanto, em guerra contra a razão” (Van Til, The Defense of the Faith). Ao negar a distinção criador-criatura, Tales inevitavelmente destrói a racionalidade. Afinal, se a água é a substância fundamental do universo, então a mente humana não passa de uma reorganização de partículas líquidas — e a lógica seria apenas uma corrente que flui de maneira arbitrária em diferentes cérebros.
Greg Bahnsen, com seu estilo cortante, afirma que “todo pensamento que rejeita o Deus bíblico como ponto de partida inevitavelmente se destrói em contradições internas” (Bahnsen, Always Ready). E este é o caso de Tales: ao tentar explicar tudo com base na água, ele não consegue sequer justificar sua própria afirmação. Qual é a regra lógica que permite derivar proposições universais a partir da observação de líquidos? O que garante que a estrutura do pensamento não é tão instável quanto as ondas do mar?
Não há, na cosmovisão de Tales, qualquer justificação para o uso da lógica, da ciência, da moral, ou mesmo da linguagem. Se tudo é água, então inclusive esta proposição (“tudo é água”) dissolve-se em si mesma. A epistemologia de Tales é como um navio feito de gelo navegando sob o sol — condenada a derreter sob a luz da verdade revelada.
III. O Engano dos Princípios Naturais
A escolha da água como princípio primeiro demonstra, além da arrogância, a ignorância espiritual de Tales. Ele olha para a criação e não reconhece o Criador. Como Paulo afirma: “os homens suprimem a verdade pela injustiça” (Rm 1:18). Em lugar de adorar ao Deus eterno, adoram os elementos criados — seja a água, o fogo, o ar, ou o átomo. A filosofia grega, desde seu início, é um culto idólatra disfarçado de sabedoria.
Clark observa que “a única alternativa à revelação divina é o irracionalismo” (Clark, Three Types of Religious Philosophy). E de fato, Tales inaugura uma tradição em que o homem tenta explicar o todo com base na parte; o eterno com base no temporal; o necessário com base no contingente. Isso é não apenas irracional, mas blasfemo. Tales não apenas estava errado — ele estava rebelando-se contra a luz que todo homem possui, a qual testifica claramente que há um Criador pessoal, racional e soberano (Sl 19:1-4).
IV. Uma Ontologia sem Garantias
Se tudo é água, então nada é necessário, nada é imutável, nada é absoluto. Mas o pensamento racional exige precisamente o contrário. Sem verdades necessárias e eternas, a ciência é impossível, a moralidade é arbitrária, e a linguagem é incoerente. O ocasionalismo bíblico — tal como defendido por Cheung — afirma que “Deus causa direta e imediatamente todos os eventos no universo” (Systematic Theology). Somente assim podemos ter uma garantia metafísica para a regularidade da natureza, para a causalidade, e para a confiabilidade da lógica.
Tales, no entanto, oferece uma “explicação” que nada explica. Ele troca a soberania de Deus pela viscosidade da água. É como tentar edificar um castelo de lógica sobre um pântano ontológico. Em vez de recorrer à Palavra infalível de Deus, Tales prefere construir sua torre de Babel líquida — uma construção que, desde o início, estava destinada ao colapso.
V. Conclusão: Tales Naufragou
Tales de Mileto não é um herói do pensamento racional, mas o primeiro náufrago do oceano do irracionalismo. Sua proposta metafísica é incoerente, autocontraditória e espiritualmente corrupta. Seu sistema não pode justificar a razão, a ciência, a moral, nem a própria filosofia. Ele é, parafraseando Bahnsen, “como um homem feito de vapor tentando firmar-se sobre nuvens enquanto constrói uma ponte com névoa”.
O pressuposicionalismo reformado, ao contrário, começa com o Deus triúno, cuja mente é o fundamento de toda lógica, ciência e moral. Rejeitar esse ponto de partida é escolher, inevitavelmente, o colapso da razão — seja na forma de empirismo, de ceticismo ou, como no caso de Tales, de um naturalismo aquático tão pueril quanto patético.
Tales não precisaria ter caído em um poço — ele já havia se afogado epistemologicamente antes mesmo de olhar para as estrelas.
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