Baseado em Vincent Cheung, ampliado
Hebreus 6 diz que aqueles que receberam os itens listados — foram “iluminados”, “provaram o dom celestial”, “se tornaram participantes do Espírito Santo” e “experimentaram a bondade da palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro” — se, depois disso, caírem, não podem ser renovados outra vez para arrependimento. Ora, como é isso o que está escrito, é isso que significa. Mas a questão essencial é: quem exatamente são essas pessoas? E o mais importante: o texto realmente descreve a apostasia final de um crente verdadeiro?
Poderíamos argumentar, por exemplo, a partir de Judas Iscariotes. Ele exerceu de fato poderes do mundo vindouro: expulsou demônios, curou enfermos e anunciou o Reino (cf. Mateus 10.1–8). Ainda assim, Jesus disse claramente: “Um de vós é um diabo” (João 6.70). Judas nunca foi verdadeiramente convertido; ele participou exteriormente da comunidade do povo de Deus, experimentou dons e bênçãos temporais do Espírito, mas nunca nasceu de novo. Assim, Judas exemplifica alguém que prova superficialmente as coisas de Deus sem jamais possuir a regeneração interior.
Mesmo assim, essa discussão sobre quem exatamente são esses descritos em Hebreus 6 já é, por si mesma, secundária. É irrelevante para o ponto central da passagem. O texto não afirma que isso de fato aconteceu com os leitores originais. Ao contrário, após advertir com severidade, o autor imediatamente diz:
“Amados, mesmo falando dessa forma, estamos convictos de coisas melhores em relação a vocês, coisas próprias da salvação” (Hebreus 6.9).
Isto é decisivo: o autor deixa claro que está convicto de que os crentes genuínos aos quais ele escreve não passarão por tal apostasia. Assim, a passagem não fornece base alguma para o arminianismo, pois não está descrevendo um caso real de perda da salvação, mas apenas apresentando uma advertência hipotética, cujo propósito é manter os santos vigilantes e perseverantes.
Podemos ilustrar assim: imagine que eu diga: “Se Deus morresse, todo o universo desapareceria.” A frase em si expressa uma verdade condicional sobre a dependência da criação em relação ao Criador. Mas isso significa que existe a real possibilidade de Deus morrer? Obviamente não! Seria absurdo concluir isso. A frase só destaca a total dependência da criação diante da impossibilidade de tal condição. Da mesma forma, Hebreus 6 fala de uma consequência terrível se alguém caísse após ter experimentado essas coisas — mas não afirma que isso realmente ocorrerá aos verdadeiros crentes.
O contexto geral de Hebreus reforça isso: o autor enfatiza repetidas vezes a fidelidade de Deus em conduzir seus filhos até o fim (cf. Hebreus 3.14; 10.14; 10.39; 12.2). A carta inteira exorta à perseverança justamente porque Deus é o autor e consumador da fé (Hebreus 12.2). Não haveria sentido em exortar, com base na obra de Cristo e na fidelidade de Deus, se tudo dependesse apenas da força humana, como quer o arminianismo.
Portanto, a doutrina reformada da perseverança dos santos afirma que os verdadeiros crentes — aqueles regenerados e unidos a Cristo — jamais cairão total e finalmente da graça. Eles podem tropeçar, vacilar e pecar gravemente, mas não perderão a salvação, pois “aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até o dia de Cristo Jesus” (Filipenses 1.6). Jesus disse:
“Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão” (João 10.28).
A perseverança dos santos não é baseada na fragilidade da vontade humana, mas na imutável graça de Deus, na eficácia da obra redentora de Cristo e no poder preservador do Espírito Santo.
A maior dificuldade em refutar o arminianismo, como Cheung destaca, muitas vezes está no arminianismo interior que persiste em nós mesmos: aquela inclinação natural do coração humano de pensar que tudo depende, no fim das contas, do nosso esforço ou decisão. É preciso mortificar esse pensamento e confiar radicalmente que “é Deus quem efetua em vós tanto o querer quanto o realizar, segundo a sua boa vontade” (Filipenses 2.13).
Referência:
CHEUNG, Vincent. Blasphemy and Mystery, pp. 51–52.
Traduzido por Luan Tavares em 10/02/2019.
https://projetoexpansionismo.tumblr.com/post/182721134109/o-arminianismo-interior