Introdução
Certa vez me perguntaram: “Se um ser com aparência de Jesus surgisse numa nave alienígena, mostrasse as mãos furadas e dissesse: ‘eu sou Jesus, eu sou um extraterrestre’, você acreditaria?”
Minha resposta foi não. Não por teimosia ou ceticismo irracional, mas porque o cristão não fundamenta o conhecimento em aparências sensoriais, mas na revelação proposicional de Deus.
O empirista pensa que sem os sentidos nada pode ser conhecido. Mas essa filosofia não apenas se autodestrói, como é refutada pela Escritura e pela própria experiência racional. O cristão, ao contrário, tem uma base firme: a Palavra de Deus, que é proposicional, autoautenticadora e garantida pelo próprio Deus onisciente.
Neste artigo, ampliarei a resposta em cinco grandes blocos:
1. A Escritura como fundamento proposicional.
2. O fracasso histórico do empirismo.
3. O ocasionalismo e a verdadeira origem do conhecimento.
4. A confiabilidade histórica da Bíblia até pelos padrões do empirismo.
5. O perigo das aparições enganosas e a suficiência da revelação.
6. A questão da indução completa, garantida apenas por Deus.
A ESCRITURA COMO FUNDAMENTO PROPOSICIONAL
A Bíblia não depende de tinta, papiro ou sentidos humanos para ser verdadeira. Mesmo que o universo fosse uma Matrix, a proposição “Cristo morreu pelos nossos pecados” (1Co 15:3) permaneceria verdadeira.
Gordon Clark, em A Christian View of Men and Things (1952, p. 56), ensina:
“Conhecimento é proposicional. Não há conhecimento fora de proposições. Os sentidos podem ocasionar crenças, mas não justificá-las como verdadeiras.”
Assim, quando cremos na Escritura, cremos em proposições reveladas por Deus, proposições que não dependem de nossa percepção sensorial, mas da onisciência divina.
O FRACASSO HISTÓRICO DO EMPIRISMO
O interlocutor supôs que crer na Bíblia exige empirismo. Mas essa suposição já está morta desde o século XVIII.
David Hume, em sua Investigação sobre o Entendimento Humano (1748), mostrou que não podemos justificar causalidade ou indução a partir de experiências. O empirismo só gera hábitos mentais, não certeza.
Immanuel Kant (1781), ao tentar salvar o empirismo, admitiu que jamais conhecemos a “coisa em si”, apenas fenômenos filtrados pela mente. Conclusão: empirismo leva ao subjetivismo.
Bertrand Russell, em The Problems of Philosophy (1912), confessa que o empirismo, levado a sério, conduz ao solipsismo.
Ou seja: o empirismo é uma estrada pavimentada para o ceticismo radical. Como base para conhecimento, fracassou filosoficamente e, mais ainda, biblicamente (Rm 1:21–23; 1Co 1:20).
OCASIONALISMO E A ORIGEM DO CONHECIMENTO
O cristão não parte de uma mente como tabula rasa. Sabemos, com Calvino (Institutas, I.3.1), que todo homem possui semen religionis, um senso inato de Deus. E sabemos que todo conhecimento é causado por Deus, não pelos sentidos.
Jonathan Edwards declarou em Of Being (1723):
“Deus é o ser contínuo e imediato de todas as coisas. Criar é causar constantemente.”
Vincent Cheung explica em Ultimate Questions (2007, p. 45):
“Os sentidos não transmitem conhecimento; eles são apenas a ocasião pela qual Deus comunica conhecimento à mente.”
Assim, Deus implanta no homem verdades a priori, e usa percepções como ocasião para introduzir outras proposições. O fundamento do conhecimento não é ver ou tocar, mas Deus causar diretamente o saber na mente.
O TESTEMUNHO HISTÓRICO DA BÍBLIA
Ainda que aceitássemos a régua do empirismo, a Bíblia se mantém incomparavelmente mais confiável que qualquer obra antiga.
Platão: 7 manuscritos, mil anos após os originais.
César: 10 manuscritos.
Homero: 643 manuscritos, com lacunas.
Novo Testamento: mais de 5.800 manuscritos gregos, muitos a menos de um século dos originais.
F. F. Bruce escreveu em The New Testament Documents (1943, p. 16):
“Não há corpo de literatura antiga no mundo que goze de tão excelente transmissão quanto o Novo Testamento.”
Portanto, mesmo no terreno do adversário, a Escritura vence. Mas, ao lê-la, o homem descobre que os sentidos não bastam: “O homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus” (1Co 2:14).
O PERIGO DAS APARIÇÕES ENGANOSAS
O tal “Jesus alienígena” poderia ser:
uma alucinação (psicológica),
uma ilusão perceptiva,
ou um disfarce demoníaco (2Co 11:14).
A Bíblia é clara:
Dt 13:1–3: Mesmo que sinais ocorram, não sigas outro deus.
Mt 24:24: Falsos cristos farão sinais e prodígios.
2Ts 2:9–11: O anticristo virá com “poder, sinais e prodígios da mentira.”
Portanto, confiar em aparências sensoriais pode ser espiritual e epistemologicamente fatal.
A INDUÇÃO COMPLETA E A ONISCIÊNCIA DE DEUS
Aqui chegamos ao ponto crucial: o problema da indução.
David Hume mostrou que da experiência nunca podemos inferir leis universais. Observar mil cisnes brancos não garante que o próximo não seja negro. A indução empírica é sempre incompleta e incerta.
O cristão, porém, não depende disso. Ao ler a Bíblia, ele recebe revelações do Deus onisciente, que possui conhecimento exaustivo e necessário de todas as coisas. Assim, quando a Escritura diz:
“Está ordenado aos homens morrerem uma só vez, vindo depois disso o juízo” (Hb 9:27),
“Todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3:23),
temos aqui indução completa: proposições universais garantidas pela mente onisciente de Deus.
Cornelius Van Til, em The Defense of the Faith (1955, p. 102), afirma:
“Somente se começarmos com a mente onisciente de Deus é que podemos ter certeza de qualquer fato em particular.”
Isso significa que, ao contrário do empirista que vive de probabilidades frágeis, o cristão possui conhecimento universal verdadeiro, porque recebe proposições do Deus que sabe todas as coisas.
A provocação inicial (“você acreditaria no Jesus alienígena?”) não resiste a uma análise séria.
Epistemologia: A verdade é proposicional e vem de Deus, não dos sentidos.
Filosofia: O empirismo levou ao ceticismo (Hume, Kant, Russell).
Teologia: Deus causa conhecimento; os sentidos são ocasião.
História: A Bíblia é incomparavelmente mais confiável que qualquer outro texto antigo.
Discernimento: Aparições podem ser ilusões, alucinações ou demônios.
Indução completa: Só Deus onisciente pode dar certeza universal; a Bíblia a oferece.
Portanto, crer na Bíblia não é depender dos sentidos, mas depender da revelação de Deus. O empirista vive de probabilidades falhas; o cristão tem certeza porque se apoia na onisciência divina. “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade.” (João 17:17)
Fontes citadas:
Clark, Gordon H. A Christian View of Men and Things. Eerdmans, 1952.
Cheung, Vincent. Ultimate Questions. Reformed Publishing, 2007.
Edwards, Jonathan. Of Being. c. 1723.
Bruce, F. F. The New Testament Documents: Are They Reliable? IVP, 1943.
Hume, David. An Enquiry Concerning Human Understanding. 1748.
Kant, Immanuel. Critique of Pure Reason. 1781.
Russell, Bertrand. The Problems of Philosophy. 1912.
Van Til, Cornelius. The Defense of the Faith. 1955.
Calvino, João. Institutas da Religião Cristã. 1559.
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