por Yuri Schein
Raella estava deitada sobre o altar, o frio da pedra pressionando suas costas e o peso da mordaça silenciando qualquer tentativa de protesto. As correntes que a prendiam cintilavam à luz trêmula das velas, lançando sombras dançantes nas paredes úmidas da caverna. Roxie e Penélope se posicionavam de cada lado, imóveis, suas presenças emanando uma mistura de sedução e perigo. O ar estava carregado, quase sólido de tensão, mas Laurent se aproximou com passos silenciosos, sua capa negra esvoaçando como um espectro.
— Calma… — murmurou ele, sua voz baixa e hipnotizante, quase cantada. — Não lute contra o inevitável. Ouça-me, e sinta a verdade de minha história.
Raella sentiu seus olhos se fixarem nele, como se cada palavra fosse um fio invisível prendendo sua mente, e o coração acelerou de forma quase dolorosa. Laurent começou a falar, sua voz mesclando melancolia e autoridade, e cada detalhe parecia desenhar uma tapeçaria de dor e obsessão.
— Nasci há setecentos anos — começou ele — em uma vila no extremo sul de Lenória. Não havia recursos, nada que me sustentasse além da astúcia. Espigas roubadas, frutas escondidas, migalhas de pão das plantações dos ricos: foi assim que sobrevivi.
Ele descreveu a Lenória Imperial da época, dominada pelos elfos, sempre em guerra com orcs; humanos, vassalos dos elfos, vivendo à margem das grandes batalhas, aprendendo a arte da sobrevivência e da furtividade. Laurent falou de sua infância solitária, sem pai, sem mãe, vagando pelas ruas e bosques, até conseguir trabalhar para um cocheiro, ganhando pequenas moedas, aprendendo a observar e a esperar.
— Aos dezoito anos — continuou, sua voz carregada de nostalgia — conheci Valéria. Ela era minha vida. Olhos castanhos, cabelos castanhos, delicada como o vento que balança as folhas da floresta. Mas a nobreza a cercava, abençoada pelos elfos, protegida, inacessível para mim… ainda assim, nós fugimos.
Laurent descreveu a vida que ele e Valéria construíram: exilados na floresta encantada, três filhos, sobrevivendo com o que colhiam, uma vida simples e feliz. Mas a felicidade durou pouco. A Dríade, necessitando de homens para procriar, tentou encantá-lo. Ele resistiu, porque seu coração pertencia a Valéria, mas a criatura ficou enfurecida.
— Ela lançou um feitiço sobre a floresta… — disse Laurent, a voz baixa e pesada. — As árvores engoliram Valéria e nossas crianças. Suas consciências humanas foram aprisionadas, fundidas à floresta, mas suas almas… presas, trágicas, perdidas.
O silêncio caiu pesado. Raella sentia o horror e a tristeza na voz do vampiro, quase esquecendo sua própria situação. Laurent continuou:
— Fui encantado pela Dríade, vivendo anos em servidão, até que uma visão da minha esposa em uma árvore queimada quebrou a magia. E, ao fugir para os Montes Lendários, fui transformado em vampiro… um guardião de mortos vivos, uma sombra sobre qualquer incauto que adentrasse esta caverna. Mas agora, Raella… — sua voz baixou ainda mais — agora terei Valéria novamente.
Raella estremeceu, a mordaça prendendo seu grito. Ela estava aterrorizada, mas cada palavra dele carregava uma estranha coerência e paixão sombria que a deixava hipnotizada, um equilíbrio entre medo e fascínio impossível de romper naquele momento. Laurent aproximou-se do altar, traçando runas complexas sobre a pedra, símbolos antigos que brilhavam em vermelho profundo, enquanto Roxie e Penélope murmuravam encantamentos, mantendo a energia do ritual concentrada.
Ele colocou suas mãos sobre Raella, deslizando suavemente pela capa negra que agora cobria parte de seu corpo. A capa reagiu, emitindo um leve brilho que pulsava em sincronia com a respiração de Raella. Suas pálpebras começaram a pesar, e, sem que percebesse, o cansaço acumulado das batalhas, o medo, e o efeito hipnótico da história de Laurent a fizeram adormecer profundamente, entregue à magia da capa e ao ritual iminente.
Laurent recuou alguns passos, contemplando o altar, suas mãos ainda iluminadas pelas runas. As sucubus se moveram em círculos, ajustando a energia do ritual, mas sem tocar nela. O silêncio da caverna tornou-se absoluto, apenas interrompido pelo crepitar das velas e o sussurro das runas, prenunciando o que estava por vir. Raella estava agora vulnerável, adormecida, enquanto o vampiro finalizava os preparativos, o destino dela completamente nas mãos do amor sombrio e obsessivo de Laurent.
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