Anaxágoras de Clazômena e o “Nous” que Não Sabe de Nada
Uma crítica pressuposicional calvinista com doses de sarcasmo e lucidez
Introdução: O herói das trevas gregas
Se os gregos antigos eram mestres na arte de produzir explicações que mais confundem do que esclarecem, é um verdadeiro paradoxo que suas filosofias continuem a ser veneradas, especialmente por aqueles que, como os modernos acadêmicos, se deslumbram com a sofisticação aparente de ideias que carecem de uma base sólida. Anaxágoras de Clazômena, que propôs que uma mente universal — o “Nous” — organizava as partículas do universo, é um exemplo clássico de um pensador que, ao tentar responder ao mistério da origem e ordem do cosmos, não fez mais do que adicionar camadas de complexidade ao que a revelação divina já esclareceu de maneira clara e acessível. O “Nous” de Anaxágoras é uma tentativa de substituir o Deus pessoal e revelador das Escrituras por uma abstração impessoal, que, por mais que seja vestida com o manto da inteligência cósmica, não possui as qualidades essenciais de uma verdadeira mente, como o ser pessoal, o propósito moral, ou a capacidade de comunicar-se de maneira proposicional.
O “Nous” de Anaxágoras será exposto como uma tentativa falha de explicação que não resolve absolutamente nada — muito menos o problema fundamental do conhecimento, da moralidade e da cosmovisão humana.
1. A mente divina que não é divina: o “Nous” anêmico de Anaxágoras
O conceito de Anaxágoras de que o universo foi ordenado por uma mente cósmica não apenas falha em fornecer uma explicação satisfatória para o cosmos, como também é uma tentativa vazia de atribuir inteligência a uma força impessoal. O “Nous”, conforme ele o apresenta, é uma mente sem personalidade, sem intenção moral, sem poder de revelação, e, acima de tudo, sem qualquer forma de envolvimento ativo ou interesse pela criação. Em outras palavras, é uma inteligência que, como uma engrenagem invisível e indiferente, iniciou o movimento do universo e, em seguida, se afastou, deixando-o à própria sorte.
Como argumentaria Gordon Clark, a ideia de uma mente que não se comunica e não age na história humana é uma contradição lógica. Uma mente que não revela proposições verdadeiras, que não pode ser conhecida ou compreendida de maneira pessoal, não é uma mente de fato. Para Clark, “uma mente sem proposições reveladas é um conceito vazio, incapaz de produzir qualquer conhecimento ou moralidade” (Clark, Religion, Reason, and Revelation). Em vez de oferecer um fundamento para o conhecimento, o “Nous” de Anaxágoras elimina qualquer base para a epistemologia verdadeira, transformando-se em um mero mito filosófico.
Vincent Cheung, que não tem reservas em criticar tais sistemas, observa que um “deus” sem revelação proposicional é equivalente a um cadáver filosófico, cujas pretensões de sabedoria apenas obscurecem a verdade. Para Cheung, essa abordagem só serve para enterrar a racionalidade ao invés de iluminá-la. O “Nous” de Anaxágoras não é uma mente inteligente, mas sim uma abstração que nunca se torna real.
2. Pressupostos absurdos: a fábula da neutralidade grega
A verdadeira falha do pensamento de Anaxágoras está em seus pressupostos fundamentais. Ele parte de uma ideia de razão autônoma, na qual o homem, com sua mente caída e corrompida pelo pecado, pode descobrir por si mesmo a estrutura do universo. Esta presunção de uma razão independente e neutra é uma das falácias mais pervasivas do pensamento filosófico ocidental e é igualmente rejeitada pela epistemologia reformada. Como Cornelius Van Til tão bem observou, o racionalismo que ignora a revelação de Deus é um “racionalismo de brincar” — uma tentativa infantil de construir uma explicação para o universo sem reconhecer o fundamento absoluto e soberano de Deus.
A falácia da neutralidade grega é um erro fatal que Anaxágoras cometeu, e que se reflete em muitos filósofos até os dias de hoje. Ao tentar construir uma cosmovisão a partir de uma razão independente da revelação de Deus, Anaxágoras perde de vista o ponto crucial: sem o Deus trinitário da Bíblia, todo esforço humano para compreender o cosmos acaba em caos racionalizado. Greg Bahnsen destaca essa ideia, observando que sem Deus, a razão humana não pode se justificar; ela não pode fundamentar a moralidade, nem a ciência, nem mesmo o próprio ato de pensar. A razão humana, isolada de Deus, é como uma vela acesa em um quarto escuro — iluminando nada.
3. A epistemologia do silêncio cósmico
Em um nível ainda mais básico, a falha do “Nous” de Anaxágoras está em sua incapacidade de fornecer qualquer tipo de comunicação proposicional. Para que o conhecimento seja possível, deve haver uma mente reveladora que compartilhe proposições claras e inteligíveis com a criação. O “Nous”, no entanto, é uma abstração sem vontade, sem palavras, sem revelação. O “silêncio cósmico” que ele impõe ao universo é tanto trágico quanto cômico, uma vez que se a mente não se comunica, então não há como a humanidade adquirir conhecimento verdadeiro sobre a criação ou sobre o próprio “Nous”.
John Frame, seguindo a tradição reformada, argumenta que “o conhecimento só é possível se houver um padrão absoluto, pessoal e revelador”, o que exclui imediatamente qualquer conceito de “mente cósmica” que não se envolva pessoalmente com a criação. O Logos cristão, por outro lado, é pessoal e comunicativo — Deus fala e se revela. O “Nous” de Anaxágoras, por mais que seja apelidado de inteligência cósmica, não é nada mais do que uma caricatura da verdadeira Mente divina revelada nas Escrituras.
4. Ontologia, caos e sementes mágicas
Anaxágoras, ao substituir um Deus pessoal por uma força cósmica impessoal, tentou justificar a ordem no universo com um conceito de partículas (sementes) que, por sua vez, contêm todas as qualidades possíveis, sendo organizadas pela mente do “Nous”. Esse tipo de cosmologia, que tenta explicar tudo em termos de entidades infinitamente pequenas que contêm potencialidades infinitas, nada mais é do que uma versão grega de alquimia filosófica. Em sua tentativa de evitar o criacionismo bíblico, Anaxágoras propôs uma explicação que, longe de trazer clareza, apenas gera mais confusão e complexidade.
Gordon Clark, ao criticar o pensamento naturalista e materialista, observa que “sem Deus, não há lógica, e sem lógica, não há ciência”. Não importa quantas sementes ou partículas Anaxágoras invente, elas não podem, por si mesmas, justificar as leis universais ou a regularidade da natureza. A ideia de uma mente impessoal organizando essas sementes não tem qualquer poder ontológico ou epistemológico real. Ela não responde à questão fundamental da origem do conhecimento, nem à pergunta sobre como e por que o universo segue leis que são, de fato, compreensíveis.
5. Ética sem Deus: o festival da incoerência
Um aspecto particularmente devastador do sistema de Anaxágoras é sua total falta de uma base moral. O “Nous” não tem qualquer capacidade de legislar, de distinguir o certo do errado, de recompensar os justos ou punir os ímpios. Anaxágoras foi, inclusive, expulso de Atenas por sugerir que o Sol era uma rocha incandescente — um crime de impiedade contra os deuses gregos. O mesmo “Nous” que organiza o cosmos não pode fornecer qualquer fundamento moral para a ação humana.
Sem uma revelação moral, tudo é relativo, e, como bem colocou Vincent Cheung, “a moralidade sem revelação é apenas preferência pessoal com pretensões divinas”. Anaxágoras, ao tentar estabelecer uma ordem cósmica sem o Deus revelador das Escrituras, acaba criando um sistema moral que é tão incoerente quanto um código de trânsito em Marte. A moralidade, sem uma base transcendental e revelada, nunca pode fornecer um verdadeiro padrão para a ação humana.
Conclusão: o Nous morto e o Logos vivo
Anaxágoras, ao propor um “Nous” impessoal como princípio organizador do universo, não apenas falhou em fornecer uma explicação para o cosmos, mas também abandonou a verdadeira fonte de sabedoria — o Deus pessoal e revelador das Escrituras. Seu “Nous”, que nunca fala, nunca age providencialmente e nunca revela proposições verdadeiras, é uma forma de idolatria filosófica disfarçada de inteligência. Em contraste, o cristianismo revela o Logos — Jesus Cristo, a Mente divina pessoal, criadora, sustentadora, legisladora e reveladora. Ele é a verdadeira fonte de toda sabedoria e conhecimento, como Paulo proclamou aos atenienses: “Este que vós adorais sem conhecer é precisamente aquele que vos anuncio” (At 17:23).
Apêndice: Cinco frases que Anaxágoras deveria ter lido (e crido)
1. “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria” — Provérbios 9:10
2. “Destruindo raciocínios e toda altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus” — 2 Coríntios 10:5
3. Gordon Clark: “Ou começamos com Deus e Sua revelação, ou não sabemos nada.”
4. Vincent Cheung: “Filosofia sem revelação é suicídio intelectual.”
5. Greg Bahnsen: “A neutralidade é um mito. Todo pensamento ou se submete a Cristo, ou se rebela contra Ele.”
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