terça-feira, 13 de maio de 2025

Sócrates Platônico: O Apóstolo da Caverna e da Reminiscência

 Sócrates Platônico: O Apóstolo da Caverna e da Reminiscência

Agora vamos falar de Platão, ou melhor do Sócrates Platônico.

Se a ignorância confessada por Sócrates já era teologicamente suicida, a sua “superação” pela via platônica é ainda mais trágica e, francamente, cômica. A partir dos diálogos médios e tardios, Platão transforma Sócrates em uma espécie de místico metafísico, capaz de contemplar realidades transcendentais com a força do pensamento puro — tudo isso sem precisar de uma única página de Escritura. É aqui que surgem algumas das ideias mais famosas atribuídas a Sócrates: os universais, o mito da caverna, a teoria da reminiscência, o mito de Er e o Anel de Giges. Cada uma dessas doutrinas é um monumento à criatividade especulativa... e ao fracasso epistemológico.

1. A Teoria dos Universais: A Missa Filosófica do Idealismo

A doutrina dos universais, também chamada de Teoria das Formas ou das Ideias, propõe que há realidades perfeitas e imutáveis — como “Justiça”, “Beleza”, “Bondade” — que existem fora do mundo físico, em um plano metafísico acessível apenas à mente purificada. Sócrates, via Platão, afirma que o conhecimento verdadeiro não é sensível nem empírico, mas racional e ideal.

Gordon Clark, em Thales a Dewey, chama esse tipo de idealismo platônico de “fantasmagoria lógica”. Ele comenta: “A crença em entidades transcendentais chamadas ‘formas’ não é superior ao politeísmo clássico; é apenas mais sofisticada. Assim como os gregos cultuavam muitos deuses, Platão cultua muitos universais.”

Além disso, Clark aponta a falha crassa: “Como o homem conhece esses universais? Por revelação? Não. Por raciocínio? Qual raciocínio? A definição de justiça nunca foi estabelecida por Sócrates, exceto por negação do que ela não é.” O esforço platônico para alcançar absolutos racionais sem revelação divina equivale a construir um edifício sobre areia movediça: erudito, mas inútil.

2. A Caverna: O Evangelho Segundo Platão

O mito da caverna, descrito na República, é o sermão filosófico mais citado por professores de cursinho e amantes do "conhecimento libertador". Nele, Sócrates/Platão sugere que os seres humanos vivem em uma caverna escura, vendo apenas sombras das coisas reais que estão fora da caverna — as tais Formas. A alma, ao se libertar da ignorância, sai da caverna e contempla a luz do verdadeiro Ser.

Soa bonito, não? Mas onde está o Deus que criou esse mundo? Onde está o Verbo que se fez carne e habitou entre nós? O mito da caverna é um plágio de Gênesis sem Deus. É a “queda” sem Adão, o “mundo de ilusão” sem pecado original, e a “redenção” sem cruz. É como se Platão dissesse: “a verdade está lá fora”, como os arquivos X — só que sem Sola Scriptura, sem salvação e sem sentido.

Vincent Cheung, em Ultimate Questions, zomba dessa concepção: “Platão queria que os homens saíssem da caverna da ignorância para entrar no pátio da especulação. Ele não libertou ninguém; apenas trocou um grilhão por outro, mais polido e metafísico.”

3. A Reminiscência: O Espiritismo Racionalista

A teoria da reminiscência afirma que aprender é recordar — ou seja, que a alma, antes de encarnar, contemplou as Formas e agora, por meio do raciocínio, relembra tais realidades. Em outras palavras, todo conhecimento é anamnese de uma existência pré-encarnada.

Ora, por que recorrer ao misticismo reencarnacionista quando temos a revelação? Isso não é sabedoria antiga, é reencarnação disfarçada de racionalismo. É doutrina espírita em grego ático. Cheung diria — e diz, em obras como Presuppositional Confrontations — que “todo conhecimento deve ter um ponto de partida infalível. A reminiscência é uma tentativa de estabelecer um fundamento epistemológico a partir de uma pré-história da alma que ninguém pode confirmar ou conhecer com certeza. É a epistemologia por nostalgia.”

Clark vai além, dizendo que “Platão transfere a origem do conhecimento para fora da experiência, mas sem revelação divina. Isso o coloca em um limbo metafísico, onde tudo é lembrado, mas nada é certo.”

4. O Mito de Er: A Teologia da Autoajuda Cósmica

No final da República, Platão coloca na boca de Sócrates o Mito de Er: um soldado morto que retorna à vida e descreve o além-morte — reencarnações, julgamentos, punições e recompensas, tudo baseado em escolhas da alma antes de encarnar.

Não se trata de revelação, mas de ficção moralizadora. Sócrates, que desprezava os poetas, termina seu maior diálogo com um dos contos mais poéticos e improváveis da literatura clássica. O mito de Er é um Apocalipse sem Deus, um Céu sem Cristo, uma Escatologia sem Escritura.

Clark, em Senhor Deus da Verdade, ironiza esse tipo de raciocínio: “Quando a razão humana é deixada por si mesma, sem a revelação de Deus, o que ela produz são mitos piedosos — belas histórias com zero poder epistemológico.” O Mito de Er é o que acontece quando Sócrates tenta imitar o livro de Apocalipse sem João, sem Cristo e sem Espírito Santo.

5. O Anel de Giges: O Pecado sem Redenção

No livro II da República, Glauco apresenta o famoso argumento do Anel de Giges — um artefato que torna seu portador invisível, permitindo-lhe agir sem consequências. A pergunta central é: se ninguém estivesse vendo, o homem ainda agiria com justiça?

A resposta implícita é pessimista: a justiça não passa de conveniência social. O homem justo age bem porque teme a punição, e não por amor ao bem.

A discussão é intrigante, mas totalmente desprovida de uma antropologia bíblica. Glauco e Sócrates reconhecem a corrupção humana, mas não a atribuem ao pecado original, nem oferecem redenção. O anel de Giges é a versão grega do livre-arbítrio total: o homem tem liberdade absoluta e, naturalmente, a usa para o mal.

Vincent Cheung responde de forma brutal: “A liberdade do homem sem Deus é apenas liberdade para pecar. É como dar uma arma a um macaco: o desastre é garantido.” E Gordon Clark completa: “Sem a imputação da justiça de Cristo, toda ética humana é ou sentimentalismo ou legalismo. O Anel de Giges apenas revela o que já está no coração do homem: inimizade contra Deus.”

VII. Epílogo: A Caverna Continua

O maior erro de Sócrates não foi sua ignorância — foi a confiança orgulhosa de que a razão humana poderia, por si mesma, sair da caverna. Ele não viu que a luz não vem de dentro, mas de fora. Não se ascende à verdade com esforço intelectual; a Verdade desceu até nós, encarnada em Cristo, com Escrituras infalíveis, lógica divina e salvação real.

A filosofia socrática é o humanismo religioso por excelência: um templo construído sem Deus. Ela encanta a mente moderna porque parece profunda, mas é apenas um poço vazio. Ela começa com perguntas legítimas, mas se recusa a aceitar a única resposta verdadeira: a Palavra revelada do Senhor.

Como escreveu Carl F. Henry: “Onde a razão humana é o ponto de partida, tudo termina em silêncio ou especulação. Mas onde a revelação divina fala, aí temos luz, lógica e vida.” Sócrates ficou no limiar da verdade — e preferiu olhar para dentro de si mesmo do que para o Deus vivo que fala.


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