por Yuri Schein
A clareira se estendia diante deles, um espaço aberto entre árvores mortas e raízes negras que se contorciam como serpentes petrificadas. O solo estava coberto por folhas secas, quebradiças, e sob a luz pálida do céu filtrada pelo denso dossel, tudo parecia reverberar com uma energia silenciosa, quase palpável. Cada respiração do grupo levantava pequenos redemoinhos de pó escuro, como se o próprio chão reagisse à presença deles.
O Ent, sua casca rugosa refletindo sombras que dançavam, ergueu ramos colossais, e sua voz grave, ecoando por toda a clareira, iniciou o teste.
— Vocês caminharam até aqui com coragem, mas coragem sozinha não basta. Cada um de vocês carrega desejos, medos e cobiças que podem corromper a alma. Hoje, neste chão, estas fraquezas serão reveladas e medidas.
O primeiro teste veio como uma ilusão física. Cada membro do grupo se viu cercado por duplicatas de si mesmo, reflexos distorcidos que gritavam suas próprias falhas e lembranças dolorosas. Gillian viu-se traindo Rufus em um campo de batalha imaginário, suas mãos cobertas de sangue de inocentes; Ikarus se viu incapaz de salvar uma aldeia sob ataque de mortos-vivos, com gritos e chamas refletindo nos olhos de crianças que ele jurara proteger.
A floresta pareceu vibrar com cada emoção, e o chão tremeu sob a pressão da magia do Ent. Raella foi a primeira a reagir, concentrando-se, usando magia de luz para dissipar as sombras ilusórias. Sua voz firme, porém trêmula, cortava o ar:
— Isto não é real! Eu… não posso deixar que ilusões governem meus pensamentos!
Os reflexos desapareceram lentamente, e o Ent soltou um rugido grave, porém admirado.
— Coragem reconhecida. Mas a força de vontade não é o único teste — disse ele, os olhos feitos de musgo e resina brilhando levemente. — Agora enfrentarão a tentação.
Raella, Gillian e Ikarus sentiram um peso invisível pressionando sobre seus ombros. À frente de cada um, surgiram objetos de desejo profundo, reflexos do que cada um mais almejava: armas lendárias, riquezas, poder e reconhecimento, todas brilhando com uma luz enganadora. O Ent continuou:
— Se cedem à cobiça, a floresta rejeita vocês. Apenas aqueles que controlam seus desejos podem seguir adiante.
Gillian hesitou, olhando para uma espada que lembrava a que Rufus carregava, mas reluziu com uma aura de energia dourada que prometia poder imenso. Ela respirou fundo, afastando a ilusão com um gesto decidido, sentindo o peso da tentação recuar. Ikarus, com olhos cerrados, ignorou o brilho de moedas e medalhas que surgiam a seus pés, e avançou sem tocar nos objetos, provando sua disciplina e autocontrole. Raella, firme em seu próprio desejo de proteger, afastou a visão de magia negra que oferecia poder ilimitado em troca de sua lealdade à cobiça.
— Vocês demonstram autocontrole — disse o Ent, erguendo ramos que tocavam o céu. — Mas ainda há mais: o teste final é da consciência e da empatia.
À medida que suas palavras ecoavam, o solo da clareira começou a se abrir, revelando dois túmulos rasos. Os corpos em decomposição de seus amigos caídos jaziam ali, lembrando ao grupo o preço de falhar. A visão era cruel, angustiante, e cada um sentiu um aperto no peito, um peso sobre a alma.
— Aqui está a verdade — continuou o Ent — não é o medo que revela caráter, mas a compaixão. Aqueles que podem olhar a morte, reconhecer o sofrimento e ainda manter sua humanidade, merecem seguir.
O grupo olhou para os corpos, e por um momento, o silêncio foi absoluto. Não havia magia, nem ilusões — apenas o peso da realidade. Gillian baixou a cabeça, lágrimas escorrendo, enquanto Ikarus fechou os punhos, respirando fundo para manter a compostura. Raella colocou a mão no ombro de Derek, em memória dos que se foram, sentindo a dor da perda e, ao mesmo tempo, a determinação de continuar.
— Vocês não falharam — disse o Ent, sua voz agora suave, carregada de uma tristeza ancestral. — Derek passou pelo teste da cobiça sozinho, e agora observo vocês: seu coração não se corrompeu diante da morte e da perda. A floresta não os rejeita.
Por fim, o Ent inclinou-se ligeiramente, revelando um detalhe surpreendente: seu tronco e galhos estavam entrelaçados com uma luz verde-viva que parecia pulsar com consciência própria.
— Eu sou o primeiro filho da Dríade, guardião ancestral desta floresta, e o mais antigo depois dela. Meu dever é proteger a vida e medir aqueles que ousam caminhar por estes caminhos sombrios. Hoje, escolhi falar com vocês, não destruí-los, pois vejo que há mais nobreza e disciplina em seus corações do que esperava.
A clareira permaneceu silenciosa, apenas o farfalhar das folhas negras e a respiração do grupo preenchendo o espaço. O Ent, imóvel como se fosse parte da própria floresta, olhava atentamente, aguardando suas próximas ações.
O ar estava pesado, carregado de magia, respeito e uma promessa não dita: o grupo havia passado pelos testes iniciais, mas a floresta ainda guardava seus segredos mais sombrios, e aquela árvore negra seria a chave para algo muito maior, algo que ainda nem sabiam existir.
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