quinta-feira, 2 de outubro de 2025

O Cavalo de Lutero e a Escravidão da Vontade

Por Yuri Schein 

Em De Servo Arbitrio (1525), Lutero lança um golpe mortal contra o mito do livre-arbítrio: “A vontade do homem é como um cavalo. Se Deus montar, vai para onde Deus quer; se o diabo montar, vai para onde o diabo quer. Não está em sua escolha correr para um ou outro cavaleiro, mas os cavaleiros lutam para possuí-lo.”

Essa imagem não é uma parábola suave, mas uma sentença brutal. O homem não é senhor de si, mas montaria. Não conduz, não escolhe, não decide. É possuído. E, no entanto, continua responsável por cada ato. Por quê? Porque Deus o responsabiliza. A justiça não é medida por uma lei acima de Deus, mas pelo próprio decreto divino.

Lutero sabia que a carne treme diante dessa verdade, mas a Palavra é clara: somos “servos do pecado” ou “servos da justiça” (Rm 6:16). Nunca livres. Ocasionalismo puro: cada pensamento e movimento é ocasião aplicada por Deus, seja para endurecimento ou para regeneração. O homem peca porque Deus decretou que peque; crê porque Deus o move a crer.

A metáfora do cavalo arranca a máscara da autonomia. Não há neutralidade, não há espaço para a pretensão molinista de um “livre-arbítrio intermediário”. A criatura não monta, é montada. E o cavaleiro é determinado pelo decreto eterno.

Essa visão é sombria para o incrédulo: Deus mesmo entrega milhões para serem montados pelo diabo, conduzidos ao abismo. Mas para o eleito é sublime: Deus cavalga sua vontade para a salvação, sem falhar, sem depender da resposta da criatura.

Lutero não deixou margem para mistérios reconfortantes. Ele expôs a verdade nua: o homem não tem vontade livre, mas uma vontade cativa. Não há honra para o cavalo, apenas para o Cavaleiro. E a revelação não traz lei contra isso.



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