Gênesis 22.17-18 registra a promessa definitiva feita por Deus a Abraão:
"Multiplicarei grandemente a tua descendência, como as estrelas do céu e como a areia que está à beira do mar; e possuirão a porta de seus inimigos. E em tua descendência serão benditas todas as nações da terra, porque obedeceste à minha voz."
Se você acha que esse texto é apenas uma poesia bonita ou um truque literário para consolar Abraão, você está completamente fora da narrativa bíblica. Aqui temos um ponto-chave para a teologia pós-milenista: Deus anuncia uma vitória histórica e progressiva que se desdobra até a consumação. A promessa é explícita: a descendência de Abraão não apenas existirá em número, mas possuirá a porta dos seus inimigos. Não é linguagem espiritualizada, mas terminologia de conquista, domínio e progresso.
O contexto não é trivial. Abraão acabara de demonstrar fidelidade extrema ao oferecer Isaque, seu filho prometido. Deus responde reafirmando a aliança com uma promessa expansiva e abrangente: multiplicação, posse sobre os inimigos e bênção universal. Cada elemento é importante para a compreensão pós-milenista:
1. Multiplicação: a descendência será incontável, como as estrelas e a areia. O que começou com um homem torna-se uma nação e, através de Cristo, se estende a todas as famílias da terra. O crescimento é histórico, mensurável e contínuo.
2. Domínio sobre os inimigos: a promessa não é de sobrevivência, mas de vitória. Não estamos falando de esperar passivamente até que Cristo volte para corrigir tudo; o triunfo começa com a descendência prometida e se realiza progressivamente na história.
3. Bênção universal: a expressão “em tua descendência serão benditas todas as nações da terra” conecta Abraão diretamente ao Messias (Gálatas 3.16) e à missão global da igreja. O mandato de influenciar, disciplinar e transformar a cultura não é opcional nem simbólico: é o núcleo da vocação histórica do povo de Deus.
Do ponto de vista pós-milenista, o texto mostra que Deus opera por continuidade histórica. A promessa não é contingente, não é futura apenas em termos espirituais ou celestiais. Ela é progressiva: Abraão inicia, Israel herda, Cristo cumpre e a igreja aplica. A vitória histórica é inevitável porque Deus não fala ao vento. Como Paulo enfatiza, “o Deus da paz em breve esmagará Satanás debaixo dos vossos pés” (Rm 16.20).
Contrastemos com o pré-milenismo: ele imagina um mundo constantemente à beira da derrota, como se a promessa abraâmica fosse um plano B, só a ser cumprido em algum milênio literal e tardio. O amilenismo faz algo similar, transformando a promessa de vitória em um “espiritualismo neutro” que dilui a realidade histórica da bênção. Mas Gênesis 22.17-18 não dá margem para tal pessimismo. A descendência promete vitória real, expansão cultural e bênção universal.
A ironia é evidente: ler Abraão com lentes pessimistas é ignorar que Deus está, desde o Éden, conduzindo a história para a vitória de seu povo. O pós-milenismo apenas reconhece que a promessa de Abraão é progressiva, histórica e universal, não uma esperança ingênua, mas a arquitetura escatológica do Reino. O que começa com um homem obediente termina com a herança de todas as nações, um triunfo visível e culturalmente transformador, exatamente como Deus planejou.
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